sexta-feira, 30 de novembro de 2012

Como é criado o dinheiro?


De todas as instituições sociais nas quais nascemos e vivemos, que nos guiam e condicionam, parece não haver nenhum sistema tão subestimado e mal compreendido como o sistema monetário. Tomando proporções quase religiosas, a instituição monetária estabelecida existe como uma das formas mais incontestadas de fé de todos os tempos. Como o dinheiro é criado, as políticas que o governam, e como realmente afecta a sociedade, são interesses desconhecidos da grande maioria da população.

Num mundo onde 1% da população detém 40% da riqueza do planeta. Num mundo onde 34 mil crianças morrem diariamente de pobreza e doenças evitáveis, e onde 50% da população vive com menos de 2 dólares por dia, uma coisa é clara: “Algo está muito errado”.
Cientes ou não desse facto, o sangue nas veias de todas as nossas instituições estabelecidas, e portanto da sociedade em si, é o dinheiro. Logo, entender essa instituição de política monetária é essencial para compreender porque a nossas vidas são como são. Infelizmente, economia é um assunto frequentemente visto com confusão e tédio. Sequências infinitas de termos financeiros, aliadas a cálculos intimidadores fazem as pessoas rapidamente desistir de tentar entendê-la. Na verdade, a complexidade associada ao sistema financeiro é somente uma máscara criada para ocultar uma das estruturas mais socialmente estagnantes que a humanidade já tolerou.
“Ninguém é mais escravo do que aquele que falsamente acredita ser livre”. Johann Goethe 1749-1832
Alguns anos atrás, o banco central dos EUA, a Reserva Federal, criou um documento chamado “Mecânica Monetária Moderna”. Esta publicação detalhava a prática institucionalizada de criação do dinheiro como é utilizada pela Reserva Federal Americana e a rede global de bancos comerciais que sustenta.
Na página de abertura, o documento afirma seu objectivo: “O propósito deste manual é descrever o processo básico de criação de dinheiro num sistema bancário de reservas fraccionadas”. Ele então descreve esse processo de reservas fraccionadas através de terminologia bancária diversa, cuja tradução seria algo como isto: O governo dos EUA decide que precisa de dinheiro. Então fala com a Reserva Federal Americana e pede, digamos, 10 biliões de dólares. A Reserva Federal responde: “Claro, vamos comprar 10 biliões em títulos públicos vosos”. Aí o governo pega nuns papéis, onde coloca símbolos que os fazem parecer oficiais, e apelida-os de títulos do Tesouro. Ele atribui a esses papéis o valor de 10 biliões de dólares e os envia para a Reserva Federal Americana. Em troca, o pessoal da Reserva Federal imprime uma certa quantidade de papéis deles mesmos. Só que desta vez, com o nome de notas da Reserva Federal Americana. Também atribuindo o valor de 10 biliões a esses papéis, a Reserva Federal pega nessas notas e troca-as pelos títulos. Assim que a transacção é concluída, o governo pega os 10 biliões em notas da Reserva Federal, e deposita em uma conta bancária. E com esse depósito, as notas de papel passam oficialmente a ter o valor de moeda, adicionando 10 biliões ao suprimento monetário dos EUA. E aí está! Foram criados 10 biliões de dinheiro novinhos em folha. Claro, este exemplo é uma generalização pois na realidade essa transacção ocorreria electronicamente sem sequer o uso de papel. De facto, só 3% do suprimento monetário dos E.U.A. existe em moeda física. Os outros 97% existem somente nos computadores. Então, títulos públicos são, por definição, instrumentos de endividamento e quando a Reserva Federal compra esses títulos com dinheiro, criado basicamente do nada, o governo está na verdade a prometer devolver esse dinheiro à Reserva Federal. Por outras palavras, o dinheiro foi criado a partir de uma dívida. Esse paradoxo aterrador, de como o dinheiro ou o valor podem ser criados a partir de dívidas ou uma responsabilidade, ficará mais claro à medida que continuamos este exercício.
Portanto, a troca foi realizada e agora 10 biliões de dólares estão numa conta bancária comercial. Aqui é onde fica interessante, já que, com base na prática de reservas fraccionadas, esse depósito de 10 biliões torna-se instantaneamente parte das reservas do banco, como qualquer depósito. E, no que se refere a exigência de reservas define a “Mecânica Monetária Moderna”: “Um banco deve manter reservas legalmente exigidas equivalente a uma percentagem definida dos seus depósitos “. Isso é quantificado quando se afirma que: “Pelas normas vigentes, a reserva exigida para a maioria das contas correntes é de 10%”.
Assim dos 10 Biliões depositados 10%, ou 1 bilião, que é guardado como a reserva exigida, os restantes são considerados excedente de reserva e podem ser usados como base para novos empréstimos. O lógico seria presumir que esses 9 biliões estão literalmente a sair do depósito existente, de 10 biliões. Porém, esse não é o caso. O que ocorre é que os 9 biliões são criados a partir do nada sobre o depósito existente de 10 biliões. E é assim que o suprimento monetário é expandido. Como é firmado no “Mecânica Monetária Moderna”: Naturalmente eles, os bancos, não saldam os empréstimos do dinheiro que recebem como depósitos. Se isso fosse feito, nenhum dinheiro adicional seria criado. O que eles fazem ao realizar empréstimos é aceitar notas promissórias “contratos de empréstimo” em troca de créditos, “dinheiro” para as contas correntes de quem toma o empréstimo. Em outras palavras, os 9 biliões podem ser criados do nada simplesmente porque existe uma demanda por tal empréstimo e porque existe um depósito de 10 biliões que atende às exigências de reserva.
Agora vamos imaginar que alguém entra nesse banco e faz um crédito dos 9 biliões recém-disponibilizados. Vai provavelmente vão pegar esse dinheiro e depositá-lo em sua própria conta bancária.
Então, o processo repete-se já que esse depósito se torna parte das reservas do banco. 10% é isolado e em seguida 90% dos 9 biliões, neste caso 8,1 biliões, tornam-se dinheiro recém-criado, disponível para mais empréstimos. E claro, esses 8,1 podem ser emprestados e redepositados criando mais 7,2 biliões mais 6,5 bilhões… mais 5,9 bilhões…e por aí em diante. Este ciclo de criação de dinheiro pode-se tornar tecnicamente infinito. O cálculo médio é de que cerca de 90 biliões de dólares podem ser criados a partir dos 10 biliões originais. Nestes termos, para cada depósito que é feito no sistema bancário, pode-se criar nove vezes esse valor a partir do nada. Agora que entendemos como o dinheiro é criado por esse sistema de reservas fraccionadas pode nos ocorrer uma pergunta lógica, ainda que desconcertante: Mas o que está a dar valor a esse dinheiro recém-criado? A resposta: o dinheiro que já existe. O dinheiro novo basicamente tira valor do suprimento monetário já existente já que o montante total de dinheiro está a aumentar independente da demanda por bens e serviços. E como a oferta e a demanda definem o equilíbrio, os preços sobem, reduzindo o poder de compra de cada dólar. Esse efeito é normalmente apelidado de inflação e a inflação é basicamente um imposto oculto cobrado às pessoas. Que conselho que você costuma receber? Dizem: “inflacione a moeda”. Não falam: “depreciem a moeda”. Não falam: “desvalorizem a moeda”. Não comentam “enganem quem já está garantido”; Antes dizem “reduza as taxas de juros”. A verdadeira fraude ocorre quando distorcemos o valor do dinheiro. Quando criamos dinheiro do nada, não temos economias. E ainda há o que se chama de “capital”.
A minha pergunta resume-se a como é que podemos esperar resolver os problemas da inflação, Ou seja, o aumento da oferta de dinheiro, com mais inflação? Claro que não podemos. O sistema de reservas fraccionadas para expansão monetária é inflacionário por si só uma vez que o acto de aumentar a oferta de dinheiro sem que haja uma expansão proporcional de bens e serviços na economia sempre vai depreciar uma moeda. De facto, uma análise rápida dos valores históricos do dólar americano em comparação com a oferta de dinheiro reflete claramente essa questão, já que a relação inversa é óbvia. 1$ em 1913 valia o equivalente a 21,60$ em 2007. Isso é uma desvalorização de 96% desde que a Reserva Federal passou a existir. Agora, se essa realidade de inflação inerente e perpétua parece absurda e economicamente auto-destrutiva… Espere um pouco, uma vez que absurdo é pouco para definir como nosso sistema financeiro realmente opera. No nosso sistema financeiro, dinheiro é dívida e dívida é dinheiro.
Num um gráfico do suprimento monetário nos EUA de 1950 a 2006 comparado com um gráfico da dívida nacional dos EUA no mesmo período repare que as tendências são virtualmente as mesmas, pois quanto mais dinheiro existe, mais dívidas. E quanto mais dívidas existem, mais dinheiro. Colocando de outro modo: cada dólar na sua carteira é devido por alguém a outra pessoa.
Lembre-se: o único modo de o dinheiro passar a existir é através de empréstimos.
Logo, se todos num país pudessem pagar todas as suas dívidas, incluindo o governo, não haveria um único dólar em circulação. “Se não houvesse dívidas em nosso sistema financeiro, não haveria dinheiro”. – Marriner Eccles – Governador da Reserva Federal / 1941. Na verdade, a última vez na história americana em que a dívida nacional foi totalmente quitada foi em 1835, depois de o presidente Andrew Jackson fechar o banco central anterior à Reserva Federal. Toda a plataforma política de Jackson girava essencialmente em torno desse compromisso de fechar o banco central.
Declarou, certa vez: “Os grandes esforços feitos pelo banco actual para controlar o governo são apenas premonições do destino que aguarda o povo americano caso sejam induzidos à perpetuação desta instituição ou ao estabelecimento de outra do mesmo tipo”. Infelizmente esta mensagem teve uma vida breve e os banqueiros internacionais conseguiram instalar outro banco central em 1913, a Reserva Federal. E enquanto essa instituição existir, o endividamento perpétuo é inevitável.
Bom, até agora discutimos o facto real de que o dinheiro é criado de dívidas a partir de empréstimos. Estes empréstimos são baseados nas reservas de um banco, reservas originadas por depósitos. Através desse sistema de reservas fraccionadas, qualquer depósito pode criar nove vezes seu valor original. Por sua vez, a depreciação do dinheiro em circulação eleva os preços para a sociedade e, como todo esse dinheiro é criado a partir de dívidas e circula aleatoriamente através do comércio, as pessoas acabam distanciadas da sua dívida original.
Existe um desequilíbrio quando pessoas são forçadas a competir por empregos a fim de obter dinheiro suficiente do suprimento monetário para cobrir seu custo de vida.Por mais defeituoso e distorcido que tudo isso pareça, ainda falta um elemento que omitimos desta equação,e é esse elemento da estrutura que revela a natureza fraudulenta inerente ao sistema: a cobrança de juros.
Quando o governo toma dinheiro emprestado da Reserva Federal, ou quando uma pessoa faz um crédito num banco, quase sempre deve ser devolvido com pesados juro .Por outras palavras, quase todos os dólares que existem um dia terão que ser devolvidos a um banco com o pagamento de juros embutidos. Porém, se todo o dinheiro é emprestado do Banco Central, e expandido pelos bancos comerciais através de empréstimos, somente o que chamamos de “principal” está sendo criado na existência de dinheiro.Então, onde está o dinheiro para cobrir os juros que são cobrados? Em lugar nenhum. Não existe. As ramificações disso são inacreditáveis, pois a quantia de dinheiro devida aos bancos sempre será maior que a quantidade de dinheiro em circulação. É por isso que a inflação é uma constante na economia,pois o dinheiro novo é sempre necessário para ajudar a cobrir o défice embutido no sistema causado pela necessidade de se pagar juros. Isso também significa que, matematicamente, a insolvência e as falências são literalmente partes do sistema. E será sempre a parte mais pobre da sociedade que sofrerá com isso. Uma analogia seria a dança das cadeiras:quando a música pára, sempre sobra alguém de fora. A ideia é essa. As riquezas verdadeiras são invariavelmente transferidas das pessoas para os bancos,pois se não copnseguir pagar sua hipoteca, a sua propriedade será tomada. Isso é particularmente revoltante quando percebe não só que a insolvência é inevitável devido à prática de reservas fraccionadas,mas também porque o dinheiro que o banco lhe emprestou nem chegou a existir legalmente.
Em 1969, houve um caso na justiça de Minnesota, E.U.A. envolvendo um homem chamado Jerome Daly, que recorreu do arresto da sua casa pedido pelo banco que lhe cedeu o empréstimo para comprá-la. O seu argumento era que o contrato de hipoteca exigia que ambas as partes, ele e o banco, possuíssem uma forma legítima de propriedade para a transacção. Em linguagem legal, isso é denominada de contraprestação (um contrato baseia-se na prestação de uma parte à outra). O Sr. Daly explicou que, na verdade, o dinheiro não era propriedade do banco já que ele havia sido criado do nada assim que contrato de empréstimo foi assinado.
Lembra-se “Mecânica Monetária Moderna”dizia sobre empréstimos? O que fazem, quando oferecem empréstimos, é aceitar notas de crédito em troca dos créditos. As reservas não são alteradas pelas transacções de empréstimo. Porém, créditos de depósitos são considerados como adições ao total de depósitos do sistema bancário. Ou seja: o dinheiro não vem dos bens que já existem. O banco está simplesmente inventando-o sem criar nada que lhe pertença excepto uma suposta responsabilidade no papel. À medida que o caso evoluiu, o Presidente do banco, o Sr. Morgan, prestou depoimento. E no memorando pessoal do juiz,ficou registado que o “reclamante, presidente do banco, admitiu que, juntamente com o Banco da Reserva Federal, criaram o dinheiro e os créditos através de lançamentos nos livros-caixa. O dinheiro e o crédito passaram a existir quando eles os criaram”. O Sr. Morgan admitiu que não havia lei ou estatuto nos E.U.A. que lhe desse o direito de fazer isso. Uma contra-prestação legal precisa existir e ser oferecida para validar a nota. “O júri concluiu que não havia uma contra-prestação legal e estou de acordo”. Poeticamente completou: “Somente Deus pode criar algo de valor a partir do nada”. Diante dessa revelação, a Corte Norte-Americana rejeitou o pedido de arresto do banco e Daly ficou com sua casa. As implicações dessa decisão judicial são imensas pois sempre que pede dinheiro emprestado a um banco, seja uma hipoteca ou o seu cartão de crédito, o dinheiro que eles lhe dão não só é falso como também é uma forma ilegítima de contra-prestação, o que portanto anula o contrato, uma vez que o banco nunca teve o dinheiro como sua propriedade. Infelizmente esses acontecimento são reprimidos e ignorados e o jogo perpétuo de transferência de riqueza e de dívidas continua. Isso leva-nos à pergunta final: Porquê? Durante a Guerra Civil americana,o presidente Lincoln rejeitou os empréstimos com altos juros oferecidos pelos bancos europeus e decidiu fazer o que os patriarcas fundadores defendiam, que era criar uma moeda independente e livre de dívidas .Isso foi chamado de “Greenback”(notas de dólar). Pouco depois de essa medida ser implantada,um documento interno circulou entre bancos americanos e ingleses,dizendo :“A escravidão é simplesmente a posse de mão-de-obra e exige cuidar dos trabalhadores, enquanto o plano europeu é que o capital controle a mão-de-obra controlando seus salários”. Isso pode ser feito controlando o dinheiro. Seria insuficiente permitir o Greenback, pois não podemos controlá-lo. A política de reservas fraccionadas praticada pela Reserva Federal que se espalhou como prática da maioria dos bancos do mundo,é na verdade um sistema moderno de escravidão.
Pense nisso: o dinheiro é criado a partir de dívidas. O que as pessoas fazem quando possuem dívidas? Buscam empregos para poder pagá-las. Mas se o dinheiro só pode ser criado a partir de empréstimos, como vai a sociedade algum dia libertar-se das dívidas? Não pode, e essa é a questão. E é o medo da perca de bens, junto com a luta para se manter com dívidas perpétuas e inflação como parte do sistema, compostos pela característica inevitável da escassez da oferta de dinheiro, criado pelos juros e que nunca poderão ser pagos que mantém o escravo do salário na linha correndo sem sair do mesmo lugar como milhões de outros. Efectivamente, fortalecendo um império que só beneficia a elite no topo da pirâmide. No fim das contas, para quem você realmente trabalha? Para os bancos! O dinheiro é criado no banco e acaba invariavelmente de retorno ao banco. Eles são os verdadeiros senhores, junto com as corporações e governos que apoiam. A escravidão física exige alojamento e comida para os trabalhadores. A escravidão económica exige que as pessoas consigam a sua própria casa e comida. Esse é um dos engodos mais engenhosos para manipulação social jamais criados. E na sua essência está em guerra invisível contra a população. A dívida é a arma usada para conquistar e escravizar sociedades, e os juros são sua munição principal. Enquanto a maioria de nós circula sem saber dessa realidade, os bancos, associados aos governos e corporações continuaram a aperfeiçoar e expandir suas tácticas de guerra económica.
Traduzido do documentário Zeitgeist Addendum de Peter Joseph e adaptado para artigo por Rolando Cardoso (FUTURAGORA)

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