terça-feira, 20 de dezembro de 2011

Responsabilidade criminal e conflito social exculpante (de lege ferenda)


Art. “£”. É isento de pena quem realiza o fato punível no contexto de profundas situações de marginalidade ou pobreza extremas, desde que tenham influenciado diretamente na conduta.
§1º. Não se aplicam as disposições desse artigo aos fatos praticados com violência contra a pessoa, não podendo ser comparada à violência a ameaça, ainda que grave.
§2º. Decidindo pelo não afastamento da responsabilidade criminal, caberá ao juiz diminuir de um sexto à metade a pena privativa de liberdade, no contexto de marginalidade e pobreza de caráter não extremo.
§3º. Comprovada a resistência expressa do agente em receber a ajuda necessária para afastá-lo do contexto de profundas situações de marginalidade ou pobreza extremas, ficará vedada a aplicação deste artigo.
§4º. Na forma da lei processual, comprovado o contexto de profundas situações de marginalidade ou pobreza extremas, por intermédio de estudo social forense, caberá ao Estado adotar as medidas necessárias para afastá-lo, em prazo não superior a 12 (doze) meses.

sexta-feira, 30 de setembro de 2011

STJ. Direito Processual Penal. Identidade física do juiz. Sentença anulada.

Na hipótese, o juiz titular estava em gozo de férias e de alguns dias de compensação, e a sentença foi proferida por juiz diverso em data quando o juiz titular já havia retomado suas funções. A Turma entendeu que, de acordo com o referido princípio, aplicado no âmbito do processo penal somente com o advento da Lei n. 11.719/2008, o magistrado que presidir a instrução criminal deverá sentenciar o feito, ou seja, o juiz que colher a prova fica vinculado ao julgamento da causa, por entender-se que seria mais fiel ao sentido do conjunto probatório, porquanto em contato direto com a prova, do que aquele que dele tomasse conhecimento apenas pelos elementos dos autos. Assim, diante da ausência de outras normas específicas que regulamentem o mencionado dispositivo legal, o STJ entende dever ser admitida a mitigação do aludido princípio nos casos de convocação, licença, promoção, aposentadoria ou afastamento por qualquer motivo que impeça o juiz que presidiu a instrução a sentenciar o feito, por aplicação analógica, devidamente autorizada pelo art. 3º do CPP, da regra contida no art. 132 do CPC. Ao prosseguir o julgamento, a 6ª Turma concedeu a ordem para anular a sentença proferida contra o paciente. HC 185.859-SP, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, julgado em 13/9/2011.

quarta-feira, 21 de setembro de 2011

STJ. Direito Processual Penal. Prova. Sigilo. Nulidade decretada.

Provas colhidas a partir de quebra de sigilos fiscal, bancário e telefônico só são admitidas se demonstrada concreta e fundamentadamente sua indispensabilidade, pela inexistência de outros meios de prova possíveis. Seguindo essa jurisprudência pacífica do Superior Tribunal de Justiça (STJ), a Sexta Turma anulou provas decorrentes de quebras de sigilo integrantes de inquérito da Polícia Federal (PF) que apura crimes contra a ordem tributária e de lavagem de dinheiro no Maranhão. A decisão não impede o seguimento da investigação, que poderá produzir novas provas independentes e sem vício.
A investigação teve início em 2006, quando o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), unidade de inteligência financeira do Brasil, encaminhou comunicação à PF dando conta de movimentação financeira atípica, no valor de R$ 2 milhões, nas contas-correntes de algumas pessoas físicas e jurídicas, entre elas, Fernando José Macieira Sarney e Teresa Cristina Murad Sarney. Esse procedimento é automático e não sinaliza necessariamente a ocorrência de crime.
O relator, ministro Sebastião Reis Júnior, concluiu que não houve indicação de elementos mínimos que pudessem justificar a quebra dos sigilos, sem que nenhuma outra investigação preliminar fosse feita ou sem demonstrar a impossibilidade de fazê-la. Por isso, trata-se de prova ilícita.
No STJ, o habeas corpus foi impetrado pelo diretor financeiro do Sistema Mirante de Comunicação, João Odilon Soares Filho, que também é sócio de uma empresa de factoring em São Luís (MA). Esta empresa é citada no relatório encaminhado à PF pelo Coaf.

Fundamentos subjetivos

De acordo com o ministro Sebastião Reis Junior, o relatório do Coaf destaca que a movimentação apontada como “atípica” não pode ser considera “ilícita”. Mas foi calcado somente nas informações constantes do relatório do Coaf que o Ministério Público Federal (MPF) requereu a quebra dos sigilos bancários dos investigados. O pedido foi deferido pelo juiz nos mesmos termos do requerimento do MPF.
“Os fundamentos, do pedido e da decisão, foram, exclusivamente, as informações do COAF e a simples referência a dispositivos legais, além da conclusão totalmente subjetiva e desacompanhada de qualquer elemento concreto de que as movimentações financeiras atípicas deveriam ser investigadas por terem ocorrido em período pré-eleitoral”, afirmou o relator.
Posteriormente, com base no mesmo comunicado do Coaf, foi instaurado novo inquérito policial e, novamente sem quaisquer outras investigações preliminares, a autoridade policial pediu e obteve a quebra de sigilo fiscal (de 2002 a 2006) e a interceptação de comunicações telefônicas e telemáticas.
Nesse pedido, o ministro Sebastião reis destacou trecho em que a própria polícia reconhece que não é possível concluir, pelo simples ofício encaminhado pelo Coaf, que os fatos narrados realmente sejam práticas de ocultação de bens, direitos e valores provenientes de crimes. A PF afirma que “certas transações e movimentações financeiras, apesar de se adequarem àqueles casos considerados suspeitos pelos diversos normativos em vigência, podem na verdade constituir atos normais de comércio ou eventuais negociações ocorridas”.

Copiar e colar

O ministro Sebastião Reis Junior apontou que as decisões de 2007 deferindo as quebras do sigilo fiscal e de dados telefônicos são idênticas à que deferiu, no ano anterior, a quebra do sigilo bancário, apesar de tomadas por juízes diferentes.
“Estamos diante, em que pese a excepcionalidade da situação, de uma cola/cópia, o que autoriza as mesmas observações referentes à decisão anterior: ausência de qualquer referência a outras investigações ou quanto à impossibilidade de se utilizar outros meios de prova para se apurar os fatos descritos pelo COAF, além de conclusões subjetivas quanto à eventual ocorrência de crime”, explicou o relator.
A partir daí, houve mais um pedido de quebra de sigilos fiscal, bancário e telefônico que incluiu outros investigados, entre os quais, o diretor financeiro do Sistema Mirante de Comunicação. Sucederam-se 18 prorrogações, que duraram quase dez meses.

Limites da prova

Para o ministro relator, é importante pesar os limites do direito à prova. “A regra, volto a dizer, é o sigilo; a quebra é a exceção”, resumiu. Ele advertiu que juiz, Ministério Público e polícia devem se “ater a ordem jurídica limitadora e garantidora dos interesses pessoais do indivíduo para, assim, sem ultrapassar essas garantias, colaborar para o processo de uma forma legal”, fornecendo provas sem vícios legais e válidas para o processo criminal.
“Todas são garantias constitucionais que, ao longo da história, com um garrido esforço da sociedade, foram conquistadas, para assim permanecerem, e nem mesmo o Estado, sem justo motivo, poderá violar”, observou o ministro Sebastião Reis.

Diligências prévias

O ministro explicou que, quando a polícia tomou conhecimento do relatório do Coaf, além da instauração do inquérito – o que não se contesta –, deveriam, por expressa previsão legal, ter sido determinadas diligências para esclarecer os fatos ali descritos, como a busca por provas testemunhais e periciais.
Conforme o ministro destacou, não há nenhuma notícia nos autos de que, antes dos requerimentos de quebra de sigilos, a PF tenha executado qualquer diligência no sentido de apurar com mais profundidade as informações encaminhadas pelo Coaf. No entender do ministro, tais informações tem cunho estritamente subsidiário.
Aplicando a Teoria dos Frutos da Árvore Envenenada, o ministro Sebastião Reis Junior votou para que toda a prova decorrente da investigação inconstitucional não seja admitida, porque contaminada.
Acompanharam a posição do relator o ministro Marco Aurélio Bellizze e o desembargador convocado Vasco Della Giustina. Com isso, devem ser retirados dos autos todos os elementos colhidos em desconformidade com a Constituição, cabendo ao juiz do caso a análise dessa extensão em relação a outras quebras de sigilos (Habeas Corpus n. 191.378/MA, 6ª Turma, rel. Min. Sebastião Reis Júnior, j. 15/09/2011, v.u.).

sábado, 3 de setembro de 2011

FURTO QUALIFICADO E PRIVILÉGIO. CABIMENTO.

A 3ª Seção do STJ, pacificando o tema, julgou procedente os embargos de divergência, adotando orientação de que o privilégio estatuído no § 2º do art. 155 do CP mostra-se compatível com as qualificadoras do delito de furto, desde que as qualificadoras sejam de ordem objetiva e que o fato delituoso não seja de maior gravidade. Sendo o recorrido primário e de pequeno valor a res furtiva, verificando-se que a qualificadora do delito é de natureza objetiva concurso de agentes e que o fato criminoso não se revestiu de maior gravidade, torna-se devida a incidência do benefício legal do furto privilegiado, pois presente a excepcionalidade devida para o seu reconhecimento na espécie. Precedentes citados do STF: HC 96.843-MS, DJe 23/4/2009; HC 100.307-MG, DJe 3/6/2011; do STJ: AgRg no HC 170.722-MG, DJe 17/12/2010; HC 171.035-MG, DJe 1º/8/2011, e HC 157.684-SP, DJe 4/4/2011. EREsp 842.425-RS, Rel. Min. Og Fernandes, j. 24/8/2011.

STJ. PENAL. EXECUÇÃO PENAL. RETROATIVIDADE DE LEI NOVA. FALTA GRAVE E DIAS REMIDOS.

A 5ª Turma do STJ concedeu habeas corpus de ofício para, reformando o acórdão e a decisão de primeiro grau, na parte referente à perda total dos dias remidos, determinar o retorno dos autos ao juízo de execuções, para que se complete o julgamento, aferindo o novo patamar da penalidade à luz da superveniente disciplina do art. 127 da LEP. Os ministros entenderam que, a partir da vigência da Lei n. 12.433/2011, que alterou a redação do art. 127 da LEP, a penalidade consistente na perda de dias remidos pelo cometimento de falta grave passa a ter nova disciplina, não mais incide sobre a totalidade do tempo remido, mas apenas até o limite de 1/3 desse montante, cabendo ao juízo das execuções, com certa margem de discricionariedade, aferir o quantum ao levar em conta a natureza, os motivos, as circunstâncias e as consequências do fato, bem como a pessoa do faltoso e seu tempo de prisão, consoante o disposto no art. 57 da LEP. Por se tratar de norma penal mais benéfica, deve a nova regra incidir retroativamente, em obediência ao art. 5º, XL, da CF/1988. HC 200.046-RS, Rel. Min. Laurita Vaz, j. 18/8/2011.

sexta-feira, 19 de agosto de 2011

Apropriação indébita previdenciária e subsidiariedade da intervenção penal.

PENAL E PROCESSUAL PENAL. APROPRIAÇÃO INDÉBITA DE CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS. ARTIGO 168-A DO CÓDIGO PENAL. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. ARTIGO 20 DA LEI 10.522/2002. APLICABILIDADE.
1. Por ocasião, do julgamento do recurso especial repetitivo representativo da controvérsia n.º 1.112.748/TO, a Terceira Seção deste Tribunal Superior de Justiça firmou o entendimento de que incide o princípio da insignificância aos débitos tributários que não ultrapassem o limite de R$ 10.000,00 (dez mil reais).
2. A Lei nº 11.457/2007 considerou como dívida ativa da União os débitos decorrentes das contribuições previdenciárias, entendo-se assim, viável, a aplicação do princípio da insignificância também no crime de apropriação indébita previdenciária, sempre que o valor do débito não for superior a R$ 10.000,00.
3. Agravo regimental desprovido.
(AgRg no REsp 1242127/PR, Rel. Ministra LAURITA VAZ, 5ª Turma, j. 14/06/2011, DJe 28/06/2011).

quinta-feira, 18 de agosto de 2011

Sistema Carcerário Brasileiro Ética PUC Rio

STF. Penal. Descaminho. Intervenção Mínima e Subsidiariedade.

Habeas Corpus. Descaminho. Tributos não pagos na importação de mercadorias. Habitualidade delitiva não caracterizada. Irrelevância administrativa da conduta. Parâmetro: art. 20 da Lei n. 10.522/02. Fragmentariedade, subsidiariedade e intervenção mínima do Direito Penal. Atipicidade da conduta. Ordem concedida.
A eventual importação de mercadoria sem o pagamento de tributo em valor inferior ao definido no art. 20 da Lei n° 10.522/02 consubstancia conduta atípica, uma vez que não faz sentido que uma conduta administrativa ou civilmente irrelevante possa ter relevância criminal.
O montante de tributos supostamente devido pelo paciente (R$ 792,10) é inferior ao mínimo legalmente estabelecido para a execução fiscal, não constando da denúncia a referência a outros débitos congêneres em nome do paciente.
Ausência, na hipótese, de justa causa para a ação penal. Princípios da subsidiariedade, da fragmentariedade, da necessidade e da intervenção mínima que regem o Direito Penal. Inexistência de lesão ao bem jurídico penalmente tutelado. Precedentes.
Ordem concedida para o trancamento da ação penal de origem.
(STF, Habeas Corpus n. 99.737/RS, 2ª Turma, rel. Min. Joaquim Barbosa, v.u., j. 17/05/2011).

terça-feira, 9 de agosto de 2011

Constitucional. Penal e Processual Penal. Júri. Soberania dos Veredictos. Inconstitucionalidade evidente. Absolvição mantida.

A 5ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) concedeu habeas corpus a réu que havia sido absolvido pelo Tribunal do Júri, mas teve a decisão anulada pelo Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJSC). Para o tribunal catarinense, os jurados teriam contrariado as provas do processo.
Porém, a decisão dos desembargadores foi por maioria de votos. Conforme explicou a ministra Laurita Vaz, o STJ entende que nessa hipótese não há como afirmar que o julgamento do Tribunal do Júri é manifestamente contrário às provas.
“Uma vez demonstrada, pela simples leitura do acórdão impugnado, a existência evidente de duas versões, a decisão dos jurados há que ser mantida em respeito ao princípio da soberania dos vereditos”, afirmou a relatora. “Somente nas hipóteses em que a tese acolhida não encontra mínimo lastro probatório nos autos é que se permite a anulação do julgamento, situação em que os jurados decidem arbitrariamente, divergindo de toda e qualquer evidência probatória, o que, definitivamente, não corresponde ao caso vertente”, completou.
O voto vencedor no TJSC afirmava que “não há dúvida de que [o réu], juntamente com os demais corréus, planejou e forneceu meios materiais para possibilitar a morte da vítima, com o intuito de se apoderar de seus bens”. O voto vencido, entretanto, avaliou que, “no mínimo, há dúvida quanto à sua participação, o que determinava a manutenção da decisão dos senhores jurados, em homenagem à sua soberania constitucionalmente assegurada”.
Um dos condenados pelo crime acusava o réu beneficiado pelo habeas corpus de ser o mentor do crime. Mas uma testemunha afirmava que este e a vítima eram amigos. Essa testemunha teria até mesmo ouvido o réu alertar a vítima para ter cuidado com o condenado, “uma pessoa falsa e que não merecia confiança”.
Em seu parecer, o Ministério Público Federal (MPF) avaliou também que “a decisão dos jurados está longe de ser fruto de ilações ou meras imaginações. Sendo assim, não é correta a anulação do julgamento quando os jurados optam por uma das correntes interpretativas da prova, sob pena de ofender o princípio constitucional da soberania dos vereditos”, acrescentou o MPF.
(Habeas Corpus n. 116.924/SC, 5ª Turma, rel. Minª Laurita Vaz, j. 09/08/2011).

sábado, 6 de agosto de 2011

STJ. PENAL. PRINCÍPIO DA SUBSIDIARIEDADE. SUBTRAÇÃO DE ÁGUA.

O paciente foi denunciado porque se constatou, em imóvel de sua propriedade, suposta subtração de água mediante ligação direta com a rede da concessionária do serviço público. Anote-se que, à época dos fatos, ele não residia no imóvel, mas quitou o respectivo débito. Dessarte, é aplicável o princípio da subsidiariedade, pelo qual a intervenção penal só é admissível quando os outros ramos do Direito não conseguem bem solucionar os conflitos sociais. Daí que, na hipótese, em que o ilícito toma contornos meramente contratuais e tem equacionamento no plano civil, não está justificada a persecução penal. Precedente citado: HC 14.337-GO, DJ 5/8/2002. HC 197.601-RJ, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 28/6/2011.

sexta-feira, 5 de agosto de 2011

STF. PROVA ILÍCITA. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO. INCONSTITUCIONALIDADE. DESENTRANHAMENTO.

São consideradas ilícitas as provas produzidas a partir da quebra dos sigilos fiscal, bancário e telefônico, sem a devida fundamentação. Com esse entendimento, a 2ª Turma deferiu habeas corpus para reconhecer a ilicitude das provas obtidas nesta condição e, por conseguinte, determinar o seu desentranhamento dos autos de ação penal. Na espécie, os pacientes foram denunciados pela suposta prática de crimes contra o Sistema Financeiro Nacional (Lei 7.492/86, artigos 11, 16 e 22, caput), lavagem de dinheiro (Lei 9.613/98, art. 1º, VI e VII ,e § 4º), e formação de quadrilha (CP, art. 288), por promoverem evasão de divisas do país, efetuarem operação de câmbio não autorizadas, operarem instituição financeira clandestina e, ainda, movimentarem recursos e valores paralelamente à contabilidade exigida pela legislação. Ressaltou-se que a regra seria a inviolabilidade do sigilo das correspondências, das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas (CF, art. 5º, XII), o que visa, em última análise, a resguardar também direito constitucional à intimidade (art. 5º, X). E, somente se justificaria a sua mitigação quando razões de interesse público, devidamente fundamentadas por ordem judicial, demonstrassem a conveniência de sua violação para fins de promover a investigação criminal ou instrução processual penal. No caso, o magistrado de primeiro grau não apontara fatos concretos que justificassem a real necessidade da quebra desses sigilos, mas apenas se reportara aos argumentos deduzidos pelo Ministério Público. Asseverou-se, ademais, que a Constituição veda expressamente, no seu art. 5º, LVI, o uso da prova obtida ilicitamente nos processos judiciais, no intuito precípuo de tutelar os direitos fundamentais dos atingidos pela persecução penal. Por fim, não se conheceu do writ na parte em que sustentada a ilegalidade das prorrogações das interceptações telefônicas, em razão da perda superveniente do objeto, uma vez que o tribunal de origem concedera a ordem em favor dos pacientes. HC 96056/PE, rel. Min. Gilmar Mendes, 28.6.2011.

terça-feira, 2 de agosto de 2011

STJ. PENAL. LEI MARIA DA PENHA. LESÃO CORPORAL LEVE. LEGITIMIDADE ATIVA. RECURSO MINISTERIAL. AÇÃO PENAL PÚBLICA CONDICIONADA À REPRESENTAÇÃO DA OFENDIDA. RECURSO IMPROVIDO.

O Ministério Público do Estado de Minas Gerais recorreu ao Superior Tribunal de Justiça na tentativa de dar prosseguimento a uma ação penal por lesão corporal leve contra a mulher, cometida em âmbito doméstico e familiar. É um caso de aplicação da Lei 11.340/06, conhecida com Lei Maria da Penha.
A denúncia não foi recebida pela Justiça mineira porque não havia representação da vítima. Segundo o processo, ocorreu a retratação, na presença do MP, antes do recebimento da denúncia. No recurso ao STJ, o MP alegou negativa de vigência do artigo 129, §9º, do Código Penal, que trata de violência doméstica, e do artigo 41, da Lei 11.340, que veda a aplicação da Lei 9.099/95 (dispõe sobre juizados especiais cíveis e criminais) em crimes com violência doméstica contra a mulher.
Em decisão individual, o desembargador convocado Adilson Vieira Macabu negou o recurso. Ele aplicou a jurisprudência do STJ, que condiciona a ação penal nos crimes de lesão corporal leve contra a mulher, em âmbito doméstico e familiar, à representação da vítima. A tese foi firmada pela Terceira Seção, em julgamento de recurso especial representativo de controvérsia (REsp 1.097.042).
Macabu explicou que o artigo 41, da Lei Maria da Penha, restringe-se à exclusão dos procedimentos sumaríssimos e das medidas “despenalizadoras” dos juizados especiais.
Ainda insatisfeito, o MP interpôs, então, agravo regimental contra a decisão de Macabu, e o caso foi analisado pela 5ª Turma do STJ. Seguindo o voto do relator e a jurisprudência da Corte, a Turma negou provimento ao agravo. A decisão foi unânime.
(REsp n. 1.122.932/MG, 5ª Turma, rel. Min. Adilson Vieira Macabu, v.u., j. 21/06/2011).

quarta-feira, 29 de junho de 2011

PENAL. PRESCRIÇÃO. ATO INFRACIONAL. PRAZO. ISONOMIA E PROTEÇÃO INTEGRAL. ORDEM CONCEDIDA.

A Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) reconheceu como consumada a prescrição da pretensão punitiva do Estado e declarou extinta a punibilidade de T.M.M. em razão de ato infracional cometido em 2005 (equiparado ao delito de ameaça previsto no artigo 147 do Código Penal), quando ele tinha 17 anos e, portanto, era menor inimputável. De acordo com voto do ministro Celso de Mello, acompanhado à unanimidade pelos demais ministros, o regime de redução de prazos de prescrição previsto no artigo 115 do Código Penal – que reduz à metade tal prazo quando o criminoso tinha, à época do crime, menos de 21 anos – abrange os atos praticados por inimputáveis.
O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJ-RS), acolhendo recurso do Ministério Público gaúcho contra o reconhecimento de prescrição pelo juiz de Palmeira das Missões (RS), havia decidido que não se aplica ao menor inimputável o regime do artigo 115 do CP. Mas, para o ministro Celso de Mello, tendo em vista a teoria constitucional da proteção integral à criança e ao adolescente, a decisão da Corte gaúcha foi equivocada e discriminatória.
“Não faz sentido estabelecer um tratamento discriminatório, porque extremamente gravoso e prejudicial ao adolescente, negando-se a aplicar, em favor do menor inimputável, norma do Código Penal que favorece o maior imputável. A jurisprudência deste STF é a de que os atos infracionais praticados por inimputáveis estão sujeitos ao regime jurídico da prescrição penal tal como esse regime se acha delineado no Código Penal. O instituto da prescrição não é incompatível com a natureza das medidas sócioeducativas”, afirmou o ministro Celso de Mello.
Ao acompanhar o voto do relator, o ministro Ayres Britto acrescentou, como fundamentação de sua decisão, o estabelecido no inciso V do artigo 227 da Constituição, que trata da proteção especial às crianças e adolescentes. Tal dispositivo estabelece que, para aplicação de qualquer medida privativa da liberdade, devem ser obedecidos os princípios da brevidade, excepcionalidade e respeito à condição peculiar da pessoa em desenvolvimento.
A ordem no Habeas Corpus (HC 107200) foi concedida de ofício, tendo em vista que o Superior Tribunal de Justiça (STJ) não conheceu do recurso lá interposto por razões formais, não tendo examinado o mérito da decisão do TJ-RS.

Natureza da ação penal nos crimes de lesão corporal leve resultantes de violência doméstica ou familiar contra a mulher

Marcos Eduardo Fuchs Pedro*

O objetivo do presente texto é analisar a natureza da ação penal no crime de lesão corporal leve cometido contra a mulher no âmbito familiar ou doméstico, conforme a redação do art. 129, §9º, do Código Penal. Pela natureza do crime (lesão leve), a ação penal depende da representação do ofendido, ou, especificamente, da ofendida, conforme disposição do art. 88, da Lei n. 9.099/95, in verbis: “Além das hipóteses do Código Penal e da Legislação especial, dependerá de representação a ação penal relativa aos crimes de lesões corporais leves e culposas”.
Neste ponto inicia-se uma controvérsia em relação à Lei Maria da Penha (Lei n. 11.340/06), pois o legislador, quando da elaboração desta lei, postulou em seu art. 41 uma proibição à incidência dos institutos da Lei n. 9.099/95, fazendo alguns intérpretes concluírem que não seria permitindo que o crime em tela fique sujeito à discricionariedade da mulher ofendida.
Apesar da expressa proibição do art. 41, da Lei n. 11.340/06, o Superior Tribunal de Justiça vem entendendo que esse dispositivo legal só alcança a transação penal e a suspensão condicional do processo, não impedindo a aplicação do art. 88, da Lei n. 9.099/95. Cumpre destacar que a própria Lei Maria da Penha se contradiz. Isso se verifica quando da leitura de dois de seus dispositivos: o art 12, inciso I e o art. 16. Segundo esses dispositivos legais, é plenamente possível a manutenção da representação da ofendida como condição para o início da persecução criminal. O art. 16, dispõe: “Nas ações penais públicas condicionadas à representação da ofendida de que trata esta lei, só será admitida a renúncia à representação perante o juiz, em audiência especialmente designada para tal finalidade, antes do recebimento da denúncia e ouvido o Ministério Público”. Portanto, se a vítima só pode retratar-se da representação perante o juiz, é porque a ação penal é condicionada à representação, não se renuncia algo que não foi anteriormente proposto. Ademais, o art 12, inciso I, da Lei n. 11.340/06, preceitua: “Em todos os casos de violência doméstica e familiar contra a mulher, feito o registro da ocorrência, deverá a autoridade policial adotar, de imediato, os seguintes procedimentos, sem prejuízo daqueles previstos no CPP...Inciso I: ouvir a ofendida, lavrar o boletim de ocorrência e tomar a representação a termo, se apresentada”. Dessa forma, nota-se que é sim de ação penal pública condicionada à representação os casos de lesão leve contra mulher, ainda que praticada no âmbito das relações domésticas. Ainda, não se olvide que não há dispositivo específico dizendo o contrário.
malgrado tais constatações legais, jurisprudência e doutrina ainda levantam a tese de que o art. 16, da Lei Maria da Penha, exige a representação somente para outros crimes cometidos contra a mulher, como por exemplo ameaça e injúria. Mas, a esta tese falta, ao meu ver, coerência sistemática, pois as disposições legais não distinguem os crimes que devem ou não ser submetidos à representação e, portanto, não cabe ao Juiz fazer essa distinção in malam partem.
Diante da dicotomia apresentada, a ação penal in casu deve ser pública condicionada à representação da ofendida, pois, concluir o contrário é sintoma de uma inconstitucionalidade, porque fere o princípio da legalidade, além de constituir uma punição sem finalidade, uma vez que a ausência de representação evidencia a pacificação de um conflito conjugal ou familiar. Dito de outra forma: se a própria vítima não possui mais o interesse em ver processado e julgado o seu agressor - e isso pode ocorrer por inúmeros motivos, pois é de âmbito individual e deve(ria) ser respeitado -, nenhuma razão assiste ao Estado em punir, punir e punir. Afinal, há outros meios de se resolver essa e tantas outras questões. O uso da coerção, tão desejado por muitos, deve ser visto de modo subsidiário, como um último plano (ultima ratio).
E, por fim, se a mulher (sujeito de direito emancipado) achar que a situação chegou a um extremo, basta não renunciar à representação.

* Acadêmico de Direito da Univille (Universidade da Região de Joinville)

quinta-feira, 16 de junho de 2011

STF considera constitucional a "marcha da maconha": garante-se a liberdade de reunião e de expressão.

O Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) reconheceu a constitucionalidade da chamada "marcha da maconha". A decisão, unânime, foi tomada no julgamento da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 187, realizado nesta quarta-feira (15/06/2011).
A ação foi ajuizada no STF pela Procuradoria-Geral da República, em 2009, para questionar a interpretação que o artigo 287 do Código Penal tem eventualmente recebido da Justiça, no sentido de considerar as chamadas marchas pró-legalização da maconha como apologia ao crime.
Seguindo o voto do relator, ministro Celso de Mello, a Corte deu interpretação conforme a Constituição ao dispositivo do Código Penal, para afastar qualquer entendimento no sentido de que as marchas constituem apologia ao crime. Para os ministros presentes à sessão, prevalece nesses casos a liberdade de expressão e de reunião. Os ministros salientaram, contudo, que as manifestações devem ser lícitas, pacíficas, sem armas, e com prévia notificação da autoridade competente.
Essa decisão tem eficácia para toda a sociedade e efeito vinculante aos demais órgãos do Poder Público, tendo validade imediata como preveem os parágrafos 1º e 3º do artigo 10 da Lei da ADPF (9.882/99).

terça-feira, 14 de junho de 2011

Promotor responderá a ação por suposta calúnia contra advogado em tribunal do Júri

Um promotor do Rio Grande do Sul não conseguiu trancar a ação penal por suposta calúnia praticada contra o advogado de um réu em julgamento no tribunal do Júri. Para a Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), a defesa do promotor não demonstrou que ele não tinha conhecimento da falsidade das acusações.
A Justiça gaúcha recebeu a queixa, por entender que a inviolabilidade do membro do Ministério Público (MP) não é absoluta nem irrestrita. Por isso, as supostas ofensas do promotor ao acusar o advogado do réu de ter praticado crime de falsidade ideológica e ser defensor de um dos maiores traficantes do estado deveriam ser aprofundadas em ação penal.
No STJ, a defesa do promotor alegava que o advogado não comprovou que ele saberia da falsidade das acusações, o que impediria o seguimento da ação. Também afirmou que a queixa deveria ter sido apresentada também contra a promotora que o acompanhava na sessão e apresentou notícia-crime contra o advogado por falsidade ideológica. Na falta da suposta coautora, teria ocorrido renúncia ao direito de queixa por parte do advogado.

Provas e coautoria

Mas o ministro Napoleão Maia Filho registrou que a apresentação de notícia-crime pela promotora com base nos mesmos fatos não levaria a eventual coautoria na calúnia. Se ela soubesse da falsidade das alegações, o crime cabível seria de denunciação caluniosa, praticado contra a administração da justiça, e não calúnia, que afeta a honra individual do ofendido.
Ele lembrou que o primeiro crime é apurado por ação privada, enquanto o segundo dá causa à ação penal pública incondicionada. A promotora, apesar de presente, não se manifestou durante a sessão do Júri.
Quanto às provas da ofensa, o relator afirmou que a defesa não demonstrou de forma clara que o promotor não tinha conhecimento prévio da falsidade dos fatos declarados aos jurados. Assim, em habeas corpus, não seria possível o aprofundamento na análise do caso.

Processos: HC 195955

segunda-feira, 6 de junho de 2011

Na falta de presídio semiaberto, preso deve ficar no regime aberto ou em prisão domiciliar

A Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) concedeu habeas corpus a um preso beneficiado com a progressão para o regime semiaberto, que continua em regime fechado por falta de local para cumprimento da pena mais branda. Os ministros determinaram que ele seja imediatamente transferido para um estabelecimento compatível com regime semiaberto ou, na falta de vaga, que aguarde em regime aberto ou prisão domiciliar.
A decisão da Sexta Turma segue a jurisprudência consolidada no STJ que considera constrangimento ilegal a permanência de condenado em regime prisional mais gravoso depois que lhe foi concedida a progressão para o regime mais brando. “Constitui ilegalidade submetê-lo, ainda que por pouco tempo, a local apropriado a presos em regime mais gravoso, em razão da falta de vaga em estabelecimento adequado”, explicou o ministro Og Fernandes, relator do habeas corpus.
O preso foi condenado por homicídio duplamente qualificado. Ele obteve a progressão prisional em outubro de 2010, e deverá cumprir pena até outubro de 2012. Até o julgamento do habeas corpus pelo STJ, ele continuava recolhido em regime fechado na Penitenciária de Paraguaçu Paulista (SP), por falta de vaga no regime semiaberto.
A Justiça paulista havia negado o habeas corpus por entender que a falta de vagas no regime semiaberto, “embora injustificável por caracterizar eventual desídia estatal”, não poderia justificar uma “precipitada e temerária soltura de condenados”. Contudo, o STJ considera que a manutenção da prisão em regime fechado nessas condições configura constrangimento ilegal.
Fonte: STJ, HC n. 196.438/SP, 6ª Turma, rel. Min. Og Fernandes, j. 31/05/2011.

segunda-feira, 30 de maio de 2011

STJ. Expulsão de estrangeiro com filhos brasileiros é negada.

A expulsão de estrangeiro com prole nacional, mesmo que nascida após condenação ou edição do decreto de expulsão, é proibida pelo ordenamento jurídico brasileiro. A única exigência é que haja relação de dependência econômica e vínculo socioafetivo entre o estrangeiro e a criança. A decisão, da Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ), afirmou haver presunção dessa dependência no caso da filha de três anos de uma moçambicana, sem paternidade declarada ou outros parentes conhecidos.
A mãe foi condenada por tráfico internacional de drogas e, após cumprir a pena, enfrentou inquérito administrativo de expulsão perante a Polícia Federal. Mas, antes de expedido o decreto de expulsão, em 2010, deu à luz uma menina, em 2008. Por isso, afirmou ser ilegal o ato do Ministério da Justiça (MJ).
O MJ sustentou que o procedimento administrativo segue a Lei n. 6.815/1980, a qual afirmaria que a maternidade superveniente não justifica a permanência do estrangeiro no país. Em parecer, o Ministério Público Federal (MPF) opinou no sentido de que essa lei deve ser interpretada de forma sistemática, de modo a harmonizá-la com as disposições posteriores da Constituição Federal e do Estatuto da Criança e do Adolescente, além de tratados internacionais firmados pelo Brasil.
Para o ministro Castro Meira, a legislação nacional visa proteger os interesses da criança não só no aspecto de assistência material, mas também para resguardar seus direitos à identidade, convivência familiar e assistência pelos pais. “A expulsão significaria condenar uma pequena cidadã brasileira a viver longe de sua terra natal, impondo-lhe um injusto degredo que não se coaduna com as garantias individuais garantidas por nossa Carta Magna”, afirmou o relator.
“No caso dos autos, revela-se patente que foram observadas as condições necessárias à concessão da ordem. A paciente é genitora de menor brasileira, nascida em 2008, sem indicação de sua paternidade no registro de nascimento, ou notícia de outros parentes que possam assumir a sua manutenção. Presume-se, assim, que a menor se acha sob a guarda e dependência econômica da paciente, o que justifica a concessão da ordem, ainda que não haja prova explicita dessa vinculação”, acrescentou.

domingo, 29 de maio de 2011

Seletividade do Sistema de Justiça Criminal

Habeas Corpus. 2. Ex-prefeito condenado pela prática do crime previsto no art. 1º, II, do Decreto-Lei 201/1967, por ter utilizado máquinas e caminhões de propriedade da Prefeitura para efetuar terraplanagem no terreno de sua residência. 3. Aplicação do princípio da insignificância. Possibilidade. 4. Ordem concedida (Habeas Corpus n. 104.286/SP, rel. Min. Gilmar Mendes).

sábado, 28 de maio de 2011

HOMICÍDIO CULPOSO. AUMENTO. PENA. REGRA TÉCNICA. BIS IN IDEM.

Trata-se de recurso em habeas corpus em que se discute o afastamento da causa de aumento de pena constante do § 4º do art. 121 do CP, relativa à inobservância de regra técnica de profissão, sustentando o recorrente que essa mesma causa foi utilizada para a caracterização do próprio tipo penal. A Turma, ao prosseguir o julgamento, por maioria, deu provimento ao recurso sob o fundamento de que, embora a causa de aumento de pena referente à inobservância de regra técnica de profissão se situe no campo da culpabilidade, demonstrando que o comportamento do agente merece uma maior censurabilidade, não se pode utilizar do mesmo fato para, a um só tempo, tipificar a conduta e, ainda, fazer incidir o aumento de pena. Consignou-se que, no caso, a peça exordial em momento algum esclarece em que consistiu a causa de aumento de pena, apenas se referindo à inobservância de regra técnica como a própria circunstância caracterizadora da negligência do agente, fazendo de sua ação uma ação típica. Assim, entendeu-se estar claro que a inobservância de regra técnica foi utilizada para configurar o próprio núcleo da culpa, não podendo servir também para possibilitar o aumento de pena, visto que não se pode recair em indesejável bis in idem. Precedentes citados do STF: HC 95.078-RJ, DJe 15/5/2009; do STJ: REsp 606.170-SC, DJ 14/11/2005.
RHC 22.557-SP, Rel. Min. Haroldo Rodrigues (Desembargador convocado do TJ-CE), julgado em 17/5/2011.

CONSTITUCIONAL. PROCESSUAL PENAL. SENTENÇA. ERRO. COISA JULGADA.

In casu, o paciente foi condenado à pena de 18 anos de reclusão em regime inicial aberto pela prática do crime tipificado no art. 157, § 3º, do CP (latrocínio). Então, o juiz de execução determinou o início do cumprimento da pena em regime fechado ao argumento de que o regime aberto foi fixado de forma equivocada. Agora a impetração no writ sustenta, em síntese, que não há como modificar o regime fixado na sentença condenatória, pois ela transitou em julgado para a condenação. Para o Min. Relator Napoleão Nunes Maia Filho e o Min. Gilson Dipp, a fixação do regime aberto para o paciente condenado à pena de 18 anos de reclusão é mero erro material, possível de correção mesmo após o trânsito em julgado da condenação. No entanto, a maioria dos Ministros da Turma aderiu à divergência inaugurada pelo Min. Jorge Mussi, que, apesar de considerar tratar-se de erro material, pois o paciente condenado por latrocínio não poderia cumprir a pena em regime inicial aberto conforme o disposto no art. 33, § 2º, do CP, reconheceu agora não haver dúvida de que ocorreu a coisa julgada, pois o MP, como fiscal da lei, deveria ter interposto os embargos declaratórios, mas deixou de fazê-lo. Observou ainda serem nesse sentido as decisões do STF. Com esse entendimento, a Turma, ao prosseguir o julgamento, concedeu a ordem.
STJ, HC 176.320-AL, Rel. originário Min. Napoleão Nunes Maia Filho, Rel. para acórdão Min. Jorge Mussi, julgado em 17/5/2011.

segunda-feira, 23 de maio de 2011

Qual o sentido da luta pela constitucionalização do sistema de justiça criminal, em um lugar tão arrebatado pelo punitivismo?

"O sentido, acho, é a entidade mais misteriosa do universo. Relação, não coisa, entre a consciência, a vivência e as coisas e os eventos. O sentido dos gestos. O sentido dos produtos. O sentido do ato de existir. Me recuso a viver num mundo sem sentido. (...) Pois isso é próprio da natureza do sentido: ele não existe nas coisas, tem que ser buscado, numa busca que é sua própria fundação. Só buscar o sentido faz, realmente, sentido. Tirando isso, não tem sentido" (Paulo Leminsky).

segunda-feira, 2 de maio de 2011

Paradoxo...

Osama Bin Laden está morto. Agora, resta matar o Direito Penal do Inimigo, o imperialismo punitivista e a transnacionalização do controle social.

terça-feira, 26 de abril de 2011

Gato Net: STF reputa atípica a ligação clandestina de TV a cabo

A 2ª Turma concedeu habeas corpus para declarar a atipicidade da conduta de condenado pela prática do crime descrito no art. 155, § 3º, do CP (“Art. 155 - Subtrair, para si ou para outrem, coisa alheia móvel: ... § 3º - Equipara-se à coisa móvel a energia elétrica ou qualquer outra que tenha valor econômico.”), por efetuar ligação clandestina de sinal de TV a cabo. Reputou-se que o objeto do aludido crime não seria “energia” e ressaltou-se a inadmissibilidade da analogia in malam partem em Direito Penal, razão pela qual a conduta não poderia ser considerada penalmente típica.
STF, HC n. 97.261/RS, 2ª Turma, rel. Min. Joaquim Barbosa, 12.4.2011.

segunda-feira, 18 de abril de 2011

STJ respeita a Constituição da República e afasta prova exclusivamente indiciária como fundamento de condenação criminal.

O acórdão condenatório proferido pelo TJ lastreou-se apenas em provas colhidas no inquérito. Porém a função do inquérito, como se sabe, é de fornecer elementos tendentes à abertura da ação penal (vide Exposição de Motivos do CPP, arts. 12 e 155, desse mesmo código, este último na redação que lhe deu a Lei n. 11.690/2008), pois, conforme vetusta doutrina, a prova, para que tenha valor, deve ser feita perante o juiz competente, mediante as garantias de direito conferidas aos indiciados e de acordo com as prescrições estabelecidas em lei. Assim, o inquérito toma feitios de instrução provisória, cabendo à acusação fazer a prova no curso da instrução criminal ou formação da culpa, atenta ao contraditório: é trabalho da acusação transformar os elementos do inquérito em elementos de convicção do juiz. Dessarte, a condenação deve fundar-se, sobretudo, nos elementos de convicção da fase judicial, o que não ocorreu na hipótese. Precedentes citados: HC 112.577-MG, DJe 3/8/2009; HC 24.950-MG, DJe 4/8/2008, e HC 56.176-SP, DJ 18/12/2006. HC 148.140-RS, Rel. Min. Celso Limongi (Desembargador convocado do TJ-SP), julgado em 7/4/2011.

quarta-feira, 13 de abril de 2011

Discursos sediciosos: Viva a liberdade!!!

ACCORDÃO em Relação os da Alçada etc.

Vistos este autos que em observância das ordens da dita senhora se fizeram summários aos vinte e nove Réus pronunciados conteudos na relação folhas 14 verso, devassas, perguntas apensos de defesa allegada pelo Procurador que lhe foi nomeado etc, Mostra-se que na Capitania de Minas alguns Vassallos da dita Senhora, animados do espírito de perfídia ambição, formaram um infame plano para se subtrahirem da sujeição, e obediência devida a mesma senhora; pretendendo desmembrar, e separar do Estado aquella Capitania, para formarem uma república independente, por meio de urna formal rebelião da qual se erigiram em chefes e cabeças seduzindo a uns para ajudarem, e concorrerem para aquella perfida acção, e communicando a outros os seus atrozes, e abomináveis intentos, em que todos guardavam maliciosamente o mais inviolável silêncio; para que a conjuração pudesse produzir effeito, que todos mostravam desejar, pelo segredo e cautela, com que se reservaram de que chegasse à notícia do Governador, e Ministros porque este era o meio de levarem avante aquelle horrendo attentado, urgido pela infidelidade e perfídia: Pelo que não só os chefes cabeças da Conjuração, e os ajudadores da rebelião, se constituíram Réus do crime de Lesa Magestade da primeira cabeça, mas também os sabedores, e consentidores della pelo seu silêncio; sendo tal a maldade e prevaricação destes Réus, que sem remorsos faltaram à mais incomendável obrigação de Vassallos e de Catholicos, e sem horror contrahiram a infâmia de traidores, sempre inherente, e anexa a tão enorme, e detestável delicto.

Mostra-se que entre os chefes, e cabeças da Conjuração o primeiro que suscitou as idéias de república foi o Réu Joaquim José da Silva Xavier por alcunha o Tiradentes, Alferes que foi da Cavallaria paga da Capitania de Minas, o qual a muito tempo, que tinha concebido o abominável intento de conduzir os povos daquella Capitania a uma rebelião; pela qual se subtrahissem da justa obediência devida á dita senhora, formando para este fim publicamente discursos sediciosos que foram denunciados ao Governador de Minas atencessor do atual, e que então sem nenhuma razão foram despresados como consta a folhas 74 folhas 68 verso folhas 127 verso e folha 2 do appenso numero 8 da devassa principiada nesta cidade; e suposta que aquelles discursos não produzissem naquelle tempo outro efeito mais do que o escândalo a abominação que mereciam, contudo como o Réu viu que o deixaram formar impunemente aquellas criminosas práticas, julgo por occasião mais oportuna para continual-as com maior efficácia, no anno de mil setecentos, e oitenta e oito em que o actual Governador de Minas tomou posse do governo da Capitania, e travava de fazer lançar a derrama, para completar o pagamento de cem arrobas de ouro, que os povos de Minas se obrigaram a pagar annualmente, pelo oferecimento voluntário que fizeram em vinte e quatro de março de mil setecentos e trinta e quatro; aceito e confirmado pelo Alvará de três de dezembro de mil setecentos e cincoenta em lugar da Capitação desde então abolida.

Porem persuadindo-se o Réu, de que o lançamento da derrama para completar o computo das cem arrobas de ouro, não bastaria para conduzir os novos à rebellião, estando elles certos, em que tinham oferecido voluntariamente aquelle computo, como um subrogado muito favoravel em lugar do quinto de ouro que tirassem nas Minas, que são um direito real eTn todas as Monarchias; passou a publicar que na derrama competia a cada pessoa pagar as quantias que arbitrou, que seriam capazes de atemorizar os povos, e pretender fazer contemeratio atrevimento, e horrendas falcidades, odioso o suavíssimo e ilustradíssimo governo da dita senhora, e as sábias providências dos seus Ministros de Estado, publicando que o actual governador de Minas tinha trazido ordem para opprimir, e arruinar os leais Vassallos da mesma senhora, fazendo com que nenhum delles pudesse ter mais de dez mil cruzados, o que jura Vicente Vieira da Morta a folhas 60 e Basilio de Brito Malheiro a folhas 52 verso ter ouvido a este Réu, e a folha 108 da devassa tirada por ordem do Governador de Minas, e que o mesmo ouvira a João da Costa Rodrigues a folhas 57, e o Conego Luiz Vieira a folhas 60, verso da devassa tirada por ordem do Vice-Rei do Estado.

Mostra-se que tendo o dito Réu Tiradentes publicado aquellas horríveis e notórias falcidades, como alicerce da infame machine, que pretendia estabelecer, comunicou em setembro de mil setecentos e oitenta e oito as suas perversas idéias, ao Réu José Alves Maciel visitando-o nesta cidade a tempo que o dito Maciel chegava de viajar por alguns Reinos estrangeiros, para se recolher a Vila Rica donde era natural, como consta a folhas 10 do appenso n. 1 e folhas 2 verso, do appenso n. 12 da devassa principiada nesta Cidade, e tendo o dito Réu Tiradentes encontrado no mesmo Maciel, não só approvação mas também novos argumentos que o confirmaram nos seus execrandos projectos como se prova a folhas 10 do dito appenso n. 1 e a folhas 7 do appenso n. 4 da dita devassa; saíram os referidos dois Réus desta Cidade para Vilia Rica Capital da Capitania de Minas ajustados em formarem o partido para a rebelião, e com effeito o dito Réu Tiradentes foi logo de caminho examinando os animos das pessoas a quem falava como foi aos Réus José Aires Gomes, e ao Padre Manoel Rodrigues da Costa; e chegando a Villa Rica a primeira pessoa a quem os sobreditos dois Tiradentes e Maciel falaram foi ao Réu Francisco de Paula Freire de Andrade que então era Tenente Coronel comandante da tropa paga da Capitania de Minas cunhado do dito Maciel; e supposto que o dito Réu Francisco de Paula hesitasse no princípio conformar-se com as idéias daqueles dois perfidos Réus, o que confessa o dito Tiradentes a folhas 10 verso do dito appenso n. 1; contudo persuadido pelo mesmo Tiradentes com falsa asserção, de que nesta Cidade do Rio de Janeiro havia um grande partido de homens de negocio promptos para ajudarem a sublevação, tanto que ella se effectuasse na Capitania de Minas; e pelo Réu Maciel seu cunhado com a phantastica promessa, de que logo que se executasse a sua infame resolução teriam socorro de Potências estrangeiras, referindo em confirmação disto algumas práticas que dizia ter por lá ouvido, perdeu o dito Réu Francisco de Paula, todo o receio como consta a folhas 10 verso e folhas 11 do appenso n. 1 e a folhas 7 do appenso n. 4 da devassa desta cidade, adotando os perfidos projectos dos ditos Réus para formarem a infame conjuração, de estabelecerem na Capitania de Minas uma república independente.

Mostra-se que na mesma Conjuração entrara o Réu Ignácio José de Alvarenga Coronel do primeiro regimento auxiliar da Companhia do Rio Verde ou fosse convidado e induzido pelo Réu Tiradentes, ou pelo Réu Francisco de Paula, como o mesmo Alvarenga confessa a folhas 10 do appenso n. 4 da devassa desta Cidade e que também entrara na mesma Conjuração do Réu Domingos de Abreu Vieira, Tenente Coronel de Cavallaria Auxiliar de Minas Novas convidado, e induzido pelo Réu Francisco de Paula como declara o Réu Alvarenga a folhas 9 do dito appenso n. 4 ou pelo dito Réu Paula juntamente com o Réu Tiradentes, e Padre José da Silva de Oliveira Rolim como confessa o mesmo Réu Domingos de Abreu a folhas 10 verso da devassa desta Cidade; e achando-se estes Réus conformes no detestável projecto de estabelecerem uma república naquella Capitania corno consta a folhas 11 do appenso n. 1 passaram a conferir sobre o modo da execução, ajuntando-se em casa do Réu Francisco de Paula a tratar da sublevação nas infames sessões que tiveram, como consta uniformemente de todas as confissões dos Réus chefes da conjuração nos, appensos das perguntas que lhe foram feitas; em cujos ventículos não só consta que se achasse o Réu Domingos de Abreu, ainda que se lhe communicava tudo quanto nelles se ajustava corno consta a folhas 10 do appenso n. 6 da devassa da Cidade, e se algumas vezes se conferisse em casa do mesmo Réu Abreu sobre a mesma matéria entre elles e os Réus Tiradentes, Francisco de Paula, e o Padre José da Silva de Oliveira Rolim; sem embargo de ser o lugar destinado para os ditos conventículos a casa do dito Réu Paula, para os quaes eram chamados estes Cabeças da Conjuração, quando algum tardava como se vê, a folhas 11 verso do appenso 1 da devassa desta Cidade, e do escripto folhas 41 da devassa de Minas do Padre Carlos Corrêa de Toledo para o Réu Alvarenga dizendo-lhe que fosse logo que estavam juntos.

Mostra-se que sendo pelo princípio do anno de mil setecentos e oitenta e nove se ajuntaram os Réus chefes da Conjuração em casa do Réu Francisco de Paula lugar destinado para os torpes, execrandos conventiculos, e ahi depois de assentarem uniformemente em que se fizesse a sublevação e motim na occasião em que se lançasse a derrama, pela qual suppunham que estaria o povo desgostoso, o que se prova por todas as confissões dos Réus nas perguntas constantes dos appensos; passaram cada um a proferir o seu voto sobre o modo de estabelecerem a sua ideada república, e resolveram que lançada a derrama se gritaria uma noite pelas ruas da dita Villa Rica - Viva a liberdade - a cujas vozes sem duvida acudiria o povo, que se achava consternado, e o Réu Francisco de Paula formaria a tropa fingindo querer rebater o motim, manejando-a com arte de dissimulação, enquanto da Cachoeira aonde assistia o Governador Geral, não chegava a sua cabeça, que devia ser-lhe cortada, o segundo voto de outros bastaria que o mesmo General fosse preso, e conduzido fora dos limites da Capitania dizendo-lhe que fosse embora, e que dissesse em Portugal que já nas Minas se não necessitava de Governadores; parecendo por esta forma que o modo de executar esta atrocissima acção ficava ao arbitrio do infame executor prova-se o referido do appenso n. l folhas 12 appenso n. 5 folhas 7 verso appenso 4 folhas 9 verso e folhas 10 pelas testemunhas folhas 103 e folhas 107 da devassa desta cidade e folhas 84 da devassa de Minas.

Mostra-se que no caso de ser cortada a cabeça do General, seria conduzido à presença do povo, e da tropa, e se lançaria um bando em nome da república, para que todos seguissem o partido do novo Governo consta do appenso n. 1 a folhas 12 e que seriam mortos todos aquelles que se lhe oppuzessem que se perdoaria aos devedores da Fazenda Real tudo quanto lhe devessem consta a folhas 89 verso da devassa de Minas e folhas 118 verso da devassa desta Cidade; em que aprehenderia todo o dinheiro pertencente à mesma Real Fazenda dos cofres reaes para pagamento da tropa consta do appenso n. 6 a folhas 6 verso e testemunhas folhas 104 e folhas 109 da devassa desta Cidade e a folhas 99 verso da devassa de Minas; assentando mais os ditos infames Réus na forma da bandeira e armas que deveria ter a nova república consta a folhas 3 verso appenso n. 12 a folhas 12 verso appenso n. 1 folhas 7 appenso n. 6 da devassa desta Cidade; em que se mudaria a Capitania para São João dâ??El-Rei, e que em Villa Rica se fundaria uma Universidade; que o ouro e diamantes seriam livres, que se formariam Leis para o governo da republica, e que o dia destinado para dar princípio a esta execranda rebellião, se avisaria aos Conjurados com este disfarce - tal dia é o baptisado - o que tudo se prova das confissões dos Réus nos appensos das perguntas; e ultimamente se ajustou nos ditos conventiculos o socorro, e ajuda com que cada um havia de concorrer.

Mostra-se, quanto ao Réu Joaquim José da Silva Xavier por alcunha o Tiradentes, que esta monstruosa perfídia depois de recitar naquellas escandalosas, e horrorosas assembléias as utilidades, que resultaria do seu enfame, se encarregou de ir cortar a cabeça do General consta a folhas 103 verso, e folhas 107, e dos appensos n. 4 a folhas 10 e n. 5 a folhas 7 verso da devassa desta cidade a folhas 99 verso da devassa de Minas, e conduzindo-a a faria patente ao povo e tropa, que estaria formada na maneira sobredita, não obstante dizer o mesmo Réu a folhas 11 verso do appenso n. 1 que só se obrigou a ir prender o mesmo General e conduzi-lo com a sua família fora dos limites da Capitania dizendo-lhe que se fosse embora parecendo-lhe talvez que com esta confissão ficaria sendo menor o seu delicto.

Mostra-se mais que este abominável Réu ideo a forma da bandeira que ia ter a república que devia constar de três triangulos com allusão as três pessoas da Santissima Trindade o que confessa a folhas 12 verso do appenso n. 1 ainda que contra este voto prevaleceu o do Réu Alvarenga que se lembrou de outra mais allusiva a liberdade que foi geralmente approvada pelos conjurados; também se obrigou o dito Réu Tiradentes a convidar para sublevação a todas as pessoas que pudesse confessa a folhas 12 appenso n. 1 satisfez ao que prometeu falando em particular a muitos cuja fidelidade pretendeu corromper principiando por expor-lhes as riquezes daquella Capitania que podia ser um Império florente, como foi a Antonio da Fonseca Pestana, a Joaquim José da Rocha, e nesta Cidade a João José Nunes Carneiro, e a Manoel Luiz Pereira, furriel do regimento de artilharia a folhas 16 e folhas 18 da devassa desta Cidade os quaes como atalharam a prática por onde o réu costumava ordinariamente principiar para sondar, os animos, não passou avante comunicar-lhe com mais clareza os seus malvados o perversos intentos confessa o Réu a folhas 18 verso appenso n. 1.

Mostra-se mais que o Réu se animou com sua costumada ousadia a convidar expressamente para o levante do Réu Vicente Vieira da Motta confessa este a folhas 73 verso e no appenso n. 20 chegando a tal excesso o descaramento deste Réu que publicamente formava discursos sediciosos aonde quer que se achava ainda mesmo pelas tavernas com mais escandaloso atrevimento, como se prova pelas testemunhas folhas 71 folhas 73 appenso n. 8 e folhas 3 da devassa desta Cidade e a folhas 58 da devassa de Minas; sendo talvez por esta descomedida ousadia com que mostrava ter totalmente perdido o temor das justiças, e o respeito e fidelidade de vida á dita senhora, reputado por um heroe entre os conjurados consta a folhas 102 e appenso n. 4 a folhas 10 da devassa desta Cidade.

Mostra-se mais que com o mesmo perfido animo, e escandalosa ousadia partiu o Réu de Villa Rica para esta Cidade em março de mil setecentos e oitenta e nove, com intento de publica e particularmente com as suas costumadas praticas convidar gente para o seu partido, dizendo a Joaquim Silvério dos Reis, que reputava ser do numero dos conjurados encontrando-o no caminho perante várias pessoas - Cá vou trabalhar para todos - o que juram as testemunhas folhas 15 folhas 99 verso folhas 142 verso folhas 100 e folhas 143 da devassa desta Cidade; e com effeito continuou a desempenhar a perfida commissão, de que se tinha encarregado nos abominaveis conventiculos falando no caminho a João Dias da Morta, para entrar na rebellião e descaradamente na estalagem da Varginha perante os Réus João da Costa Rodrigues e Antonio de Oliveira Lopes, dizendo a respeito do levante que - não era levantar que era restaurar a terra - expressão infame de que já tinha usado em casa de João Rodrigues de Macedo sendo reprehendido de falar em levante, consta a folhas 61 da devassa desta Cidade e a folhas 36 da devassa de Minas.

Mostra-se que nesta cidade falou o Réu com o mesmo atrevimento e escandalo, em casa de Valentim Lopes da Cunha perante várias pessoas, por occasião de se queixar o soldado Manoel Corrêa Vasques, de não poder conseguir a baixa que pretendia ao que respondeu o Réu como louco furioso que era muito bem feito que sofresse a praça, e que o assentasse, porque os cariocas americanos (sic) eram fracos vis de espíritos baixos porque podiam passar sem o julgo que soffriam, e viver independentes do Reino, e o toleravam, mas que se houvesse alguns como elle Réu talvez, que fosse outra cousa, e que elle receava que houvesse levante nas Capitanias de Minas, em razão da derrama que se esperava, e que em semelhantes circunstâncias seria facil de cujas expressões sendo repreendido, pelos que estavam presentes, não declarou mais os seus perversos e horríveis intentos consta a folhas 17 folhas 18 da devassa desta Cidade; e sendo o Vice-Rei do Estado já a este tempo informado dos aborninaveis projectos do Réu, mandou vigiar-lhe os passos, e averiguar as casas aonde entrava, de que tendo elle alguma noticia ou aviso, dispoz a sua fugida pelo sertão para as Capitanias de Minas sem dúvida para ainda executar os seus malévolos intentos se pudesse occultando-se para este fim em casa do Réu Domingos Fernandes, aonde foi preso achando-se-lhe as cartas dos Réus Manoel José de Miranda, e Manoel Joaquim de Sá Pinto do Rego Forte, para o Mestre de Campo Ignácio de Andrade o auxiliar na fugida [...]

Portanto condenam ao Réu Joaquim José da Silva Xavier por alcunha o Tiradentes Alferes que foi da tropa paga da Capitania de Minas a que com baraço e pregão seja conduzido pelas ruas publicas ao lugar da forca e nella morra morte natural para sempre, e que depois de morto lhe seja cortada a cabeça e levada a Villa Rica aonde em lugar mais publico della será pregada, em um poste alto até que o tempo a consuma, e o seu corpo será dividido em quatro quartos, e pregados em postes pelo caminho de Minas no sitio da Varginha e das Sebolas aonde o Réu teve as suas infames práticas e os mais nos sitios (sic) de maiores povoações até que o tempo também os consuma; declaram o Réu infame, e seus filhos e netos tendo-os, e os seus bens applicam para o Fisco e Câmara Real, e a casa em que vivia em Villa Rica será arrasada e salgada, para que nunca mais no chão se edifique e não sendo própria será avaliada e paga a seu dono pelos bens confiscados e no mesmo chão se levantará um padrão pelo qual se conserve em memória a infamia deste abominavel Réu; igualmente condemnam os Réus Francisco de Paula Freire de Andrade Tenente Coronel que foi da Tropa paga da Capitania de Minas, José Alves Maciel, Ignácio José de Alvarenga, Domingos de Abreu Vieira, Francisco Antonio de Oliveira Lopez, Luiz Vás de Toledo Piza, a que com baraço e pregão sejam conduzidos pelas ruas públicas ao lugar da forca e nella morram morte natural para sempre, e depois de mortos lhe serão cortadas as suas cabeças e pregadas em postes altos até que o tempo as consuma as dos Réus Francisco de Paula Freire de Andrade, José Alves Maciel e Domingos de Abreu Vieira nos lugares de fronte das suas habitações que tinham em Villa Rica e a do Réu Ignácio José de Alvarenga, no lugar mais publico na Villa de São João de El-Rei, a do Réu Luiz Vaz de Toledo Piza na Villa de São José, e do Réu Francisco Antonio de Oliveira Lopes defronte do lugar de sua habitação na porta do Morro; declaram estes Réus infames e seus filhos e netos tendo-os, e os seus bens por confiscados para o Fisco e Câmara Real, e que suas casas em que vivia o Réu Francisco de Paula em Villa Rica aonde se ajuntavam os Réus chefes da conjuração para terem os seus infames conventiculos serão também arrasadas e salgadas sendo próprias do Réu para que nunca mais no chão se edifique. Igualmente condemnam os Réus Salvador Carvalho de Amaral Gurel, José de Resende Costa Pae, José de Resende Costa Filho, Domingos Vidal Barbosa, que com baraço e pregão sejam conduzidos pelas ruas públicas, lugar da forca e nella morram morte natural para sempre, declaram estes Réus infames e seus filhos e netos tendo-os e os seus bens confiscados para o Fisco e Câmara Real, e para que estas execuções possam fazer-se mais comodamente, mandam que no campo de São Domingos se levante uma forca mais alta do ordinario. Ao Réu Claudio Manoel da Costa que se matou no carcere, declaram infame a sua memoria e infames seus filhos e netos tendo-os e os seus bens por confiscados para o Fisco e Câmara Real. Aos Réus Thomás Antonio Gonzaga, Vicente Vieira da Morta, José Aires Gomes, João da Costa Rodrigues, Antonio de Oliveira Lopes condemnam em degredo por toda a vida para os presidios de Angola, o Réu Gonzaga para as Pedras, o Réu Vicente Vieira para Angocha, o Réu José Aires para Embaqua, o Réu João da Costa Rodrigues para o Novo Redondo; o Réu Antonio de Oliveira Lopes para Caconda, e se voltarem ao Brasil se executará nelles a pena de morte natural na forca, e applicam a metade dos bens de todos estes Réus para o Fisco e Camara Real. Ao Réu João Dias da Morta condemnam em dez anos de degredo para Benguela, e se voltar a este Estado do Brasil e nelle for achado morrerá morte natural na forca e applicam a terça parte dos seus bens para o Fisco e Camara real. Ao Réu Victoriano Gonçalves Veloso condemnam em açoutes pelas ruas publicas, tres voltas ao redor da forca, e degredo por toda a vida para a cidade de Angola, achado morrerá morte natural na forca para sempre, e applicam a metade de seus bens para o Fisco e Camara Real. Ao Réu Francisco José de Mello que faleceu no carcere declaram sem culpa, e que se conserve a sua memória, segundo o estado que tinha. Aos Réus Manoel da Costa Capanema e Faustino Soares de Araújo absolvem julgando pelo tempo que tem tido de prisão purgados de qualquer presumpção que contra elles podia resultar nas devassas. Igualmente absolvem aos Réus João Francisco das Chagas e Alexandre escravo do Padre José da Silva de Oliveira Rolim, a Manoel José de Miranda e Domingos Fernandes por se não provar contra elles o que basta para se lhe impor pena, e ao réu Manoel Joaquim de Sá Pinto do Rego Fortes fallecido no carcere declaram sem culpa e que conserve a sua memória segundo o estado que tinha; aos Réus Fernando José Ribeiro, José Martins Borges condemnam ao primeiro em degredo por toda a vida para Benguela e em duzentos mil para as despesas da Relação, e ao Réu José Martins Borges em açoutes pelas ruas publicas e dez annos de galés e paguem os Réus as custas. Rio de Janeiro,18 de Abril de 1792.

Vas.los

Gomes Ribrº

Cruz e Silva

Veiga

Figdº

Guerreiro

Montrº

Gayoso."

Os juizes que condenaram Tiradentes e assinaram a sentença apenas com o sobrenome foram:

Sebastião Xavier de Vasconcellos Coutinho (Chanceler da Rainha); Antônio Gomes Ribeiro; Antônio Diniz da Cruz e Silva; José Antônio da Veiga; João de Figueiredo; João Manoel Guerreiro de Amorim Pereira; Antônio Rodrigues Gayoso e Tristão José Monteiro

Fonte: "Sentença Criminal", Adalto Dias Tristão, Ed.DelRey, 4ªEd., 1999

sábado, 9 de abril de 2011

Letter to Bono: We Are One!!!

Esteemed Bono,

My name is Leandro Gornicki Nunes. I’m a lawyer and professor of Criminal Law in Brazil. I live in Joinville, State of Santa Catarina. Since the beginning of my adolescence I am fan of the U2 because of the precious work of awareness and fight for Human Rights that it spreads out in the world.

In our country, in contrast of what many think, the democracy possesses great problems. Really, we do not have wars declared, religious disputes or dictatorships, since 1985. But, the social inequalities are greats, having many people in situation of extreme poverty.

To contain the miserable masses, our agents politicians are using the system of criminal justice as main tool of social control. In 20 (twenty) years (1990-2010), the jail population of the country grew 450% (four hundred and fifty percent). This is an unacceptable capture of the misery. The main ones reached are the young poor persons who inhabit the great urban centers, places where concrete actions for insertion of these young in a life with citizenship are not made.

Ahead of this situation, I appeal to your social conscience and to your world-wide prestige for, for intermediary of your voice, we declare our repudiation to this type of criminal politics that confronts the democratic ideals and the Human Rights.

Our youth needs support and the power of your voice is capable to assist millions of young that are oppressed by the neoliberal globalization.

I make this for believing that “We are One”!

Cordials greetings,

LEANDRO GORNICKI NUNES
From Joinville/SC - Brazil

quinta-feira, 7 de abril de 2011

STF faz valer a presunção de inocência na execução penal

A existência de ação penal em curso não pode ser considerada para afastar a progressão de regime de cumprimento da pena. Esse o entendimento da 1ª Turma ao conceder, em parte, habeas corpus para determinar que o juízo de 1º grau analise se o paciente preenche os requisitos legais para progredir ao regime semi-aberto, nos termos do art. 112 da Lei de Execução Penal - LEP (“A pena privativa de liberdade será executada em forma progressiva com a transferência para regime menos rigoroso, a ser determinada pelo juiz, quando o preso tiver cumprido ao menos um sexto da pena no regime anterior e ostentar bom comportamento carcerário, comprovado pelo diretor do estabelecimento, respeitadas as normas que vedam a progressão”). Asseverou-se que tais requisitos seriam cumulativos, razão pela qual, atestado o seu preenchimento pelo juiz da execução, não se revelaria lícita a sua negativa com fundamento apenas na situação processual indefinida do réu, porquanto a isso corresponderia antecipar o juízo condenatório. Consignou-se que o ordenamento jurídico pátrio vedaria a possibilidade de alguém ser considerado culpado com respaldo em meras suspeitas, tendo em vista o princípio da presunção de inocência (CF, art. 5º, LXII) (STF, HC n. 99141/SP, 1ª Turma, rel. Min. Luiz Fux, j. 29.3.2011).

Fonte: Informativo n. 621, do STF.

terça-feira, 5 de abril de 2011

STJ observa a legalidade e diz que é possível a progressão de regime prisional sem exame criminológico

A Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), por maioria, concedeu habeas corpus para favorecer um condenado ao qual havia sido negado o direito de progredir de regime prisional, pelo fato de não ter sido submetido a exame criminológico. Segundo o desembargador convocado Adilson Vieira Macabu, o exame pode ser necessário em algumas situações, mas já não é obrigatório nos termos da Lei de Execução Penal em vigor.
O habeas corpus foi pedido em favor de um condenado que obtivera do juiz da execução decisão favorável à progressão do regime de cumprimento da pena. De acordo com o juiz, a realização do exame criminológico não era necessária, pois não havia relato de nenhum fato anormal em relação ao preso. Ao contrário, a direção do presídio informou que o detento, cumprindo pena desde 2003, nunca cometeu nenhuma infração disciplinar e voltou de todas as saídas temporárias.
A decisão do juiz foi reformada pelo Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) que, ao julgar recurso do Ministério Público, determinou o retorno do preso ao regime fechado até que se comprovasse, por meio de exame criminológico, o preenchimento dos requisitos para a progressão.
Dois dos cinco ministros da Quinta Turma consideraram que o exame deveria mesmo ser exigido, pois se trata de meio eficiente para avaliar as condições pessoais do preso e não é constrangedor ou invasivo, limitando-se a entrevista com um especialista. Autor do voto vencedor, Adilson Macabu considerou que o atendimento dos requisitos subjetivos da progressão não depende, necessariamente, dessa entrevista.
Para o desembargador convocado, a decisão do juiz de primeiro grau foi suficientemente fundamentada nas informações favoráveis oferecidas pela direção do presídio. Quanto ao requisito objetivo, observou que o preso já havia cumprido um sexto da pena, conforme exige a lei. Já a decisão do TJSP, segundo o desembargador, está fundamentado apenas na gravidade do crime, “em flagrante contrariedade” com o disposto no artigo 112 da Lei de Execução Penal, cuja redação atual foi dada pela Lei n. 10.792/2003.
Diz esse artigo que “a pena privativa de liberdade será executada em forma progressiva com a transferência para regime menos rigoroso, a ser determinada pelo juiz, quando o preso tiver cumprido ao menos um sexto da pena no regime anterior e ostentar bom comportamento carcerário, comprovado pelo diretor do estabelecimento, respeitadas as normas que vedam a progressão”. O parágrafo primeiro exige que a decisão seja motivada e precedida por manifestação do Ministério Público.
“Não afasto a possibilidade de realização do referido exame e não vejo óbice à sua realização, quando necessário. Por outro lado, dentro da nossa atual sistemática legal, tal exame não é mais obrigatório”, afirmou o desembargador convocado.

Ver: STJ, HC n. 175.411, 5ª Turma, rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho.

Autorização de escutas telefônicas apenas com base em denúncia anônima é ilegal

A Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), por maioria, considerou ilegais as provas obtidas a partir de escutas telefônicas na operação Castelo de Areia. Os ministros entenderam que a denúncia anônima foi o único fundamento para autorização judicial das interceptações, o que não é admitido pela jurisprudência consolidada do STJ e do Supremo Tribunal Federal (STF). Os dois habeas corpus que questionavam a legalidade da operação foram parcialmente concedidos.
O julgamento foi retomado nesta terça-feira (5), com a apresentação do voto-vista do desembargador convocado Celso Limongi. Ele considerou ilegal a autorização judicial de escutas telefônicas com base apenas em denúncia anônima. Limongi ressaltou que o sigilo telefônico é direito fundamental garantido no artigo 5º da Constituição Federal e sua violação precisa de fundamentação minuciosa. “Verifico que a requisição das interceptações telefônicas é baseada em termos genéricos, destituída de fundamentação”, afirmou.
Para Limongi, a delação anônima serve para o início das investigações de forma que a autoridade policial busque provas, mas não serve para violação de qualquer direito fundamental do ser humano. O voto segue a posição da relatora do caso, ministra Maria Thereza de Assis Moura, que também foi acompanhado pelo desembargador convocado Haroldo Rodrigues.

Provas ilegais

A operação Castelo de Areia foi iniciada em 2008 pela Polícia Federal para apurar indícios de crimes financeiros, como evasão de divisas e lavagem de dinheiro, que envolveriam várias pessoas, entre elas dirigentes da Construtora Camargo Corrêa. Também haveria indícios de ramificações criminosas na administração pública.
Um habeas corpus foi impetrado pela defesa de um suposto doleiro e o outro em favor de três executivos da construtora Camargo Corrêa.
No início do julgamento dos habeas corpus, em 14 de setembro do ano passado, a ministra Maria Thereza de Assis Moura votou pela concessão parcial da ordem, considerando ilegais as provas obtidas a partir da quebra do sigilo telefônico dos acusados. Para ela, a autorização judicial das intercepções não poderia ter sido baseada apenas em denúncias anônimas recebidas pela Polícia Federal. A ministra considerou que a ordem judicial foi genérica e indiscriminada.

Divergência

A divergência foi inaugurada pelo ministro Og Fernandes, em voto-vista apresentado em 15 de março deste ano. Ele considerou as investigações legais, bem como todos os atos processuais realizados. Para o ministro, o indispensável acesso aos dados telefônicos não foi concedido em razão da denúncia anônima, mas de elementos colhidos pela polícia em apurações preliminares que tiveram a informação anônima apenas como ponto de partida. Og Fernandes ficou vencido.

Ver: STJ, HC n. 137.349/SP, 6ª Turma, Rel. Minª Maria Thereza de Assis Moura, j. 05/04/2011.

Garantismo Jurídico e Controle de Constitucionalidade Material: Aportes Hermenêuticos - 2. ed. 2011

Obra indispensável para a concretização do projeto de constitucionalização do sistema de justiça criminal.

Autor: Alexandre Morais Da Rosa

Saiba mais sobre esse livro.

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quarta-feira, 16 de março de 2011

Não se pode exigir pagamento de fiança de réu pobre

O pagamento da fiança não é imprescindível para concessão da liberdade provisória. Por isso, é ilegal manter preso o réu pobre apenas em razão do não pagamento da fiança. A decisão é da Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ).
O réu responde por furto simples, que tem pena mínima de um ano, e já ficou preso por mais de seis meses. O juiz concedeu a fiança, afirmando que a custódia do réu seria desnecessária. Mas não concedeu a liberdade pela falta de pagamento da fiança, fixada em R$ 830.
Para a ministra Maria Thereza de Assis Moura, o réu é reconhecidamente pobre, sendo assistido por defensora pública. Isso já garantiria seu direito à liberdade, desde que, como reconhecido pelo magistrado, estivessem ausentes os requisitos para a custódia cautelar.
A Turma determinou, ainda, que o juiz informe o cumprimento da ordem, sob pena de comunicação do fato ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ). É que a liminar, deferida há mais de dois anos, ainda não teria sido cumprida, segundo o juiz de primeiro grau, porque a Secretaria de Justiça do Piauí não teria informado o local de cumprimento da pena pelo réu.
(STJ, HC n. 113275/PI, 6ª Turma, relª. Minª Maria Thereza de Assis Moura, j. 03/02/2011, v.u.).

PS: Sabe quem impetrou a ordem? Não?!!! A DEFENSORIA PÚBLICA! Se não fosse a persistência desse órgão, o infeliz do paciente estaria preso até hoje por causa da acusação de furto simples... E ainda tem gente que é contra a Defensoria Pública...

segunda-feira, 14 de março de 2011

Dolo eventual e qualificadora: incompatibilidade

São incompatíveis o dolo eventual e a qualificadora prevista no inciso IV do § 2º do art. 121 do CP (“§ 2º Se o homicídio é cometido: ... IV - à traição, de emboscada ou mediante dissimulação ou outro recurso que dificulte ou torne impossível a defesa do ofendido”). Com base nesse entendimento, a 2ª Turma deferiu habeas corpus impetrado em favor de condenado à pena de reclusão em regime integralmente fechado pela prática de homicídio qualificado descrito no artigo referido. Na espécie, o paciente fora pronunciado por dirigir veículo, em alta velocidade, e, ao avançar sobre a calçada, atropelara casal de transeuntes, evadindo-se sem prestar socorro às vítimas. Concluiu-se pela ausência do dolo específico, imprescindível à configuração da citada qualificadora e, em conseqüência, determinou-se sua exclusão da sentença condenatória. Precedente citado: HC 86163/SP (DJU de 3.2.2006).

STF, HC N. 95.136/PR, 2ª Turma, rel. Min. Joaquim Barbosa, 1º.3.2011.

quinta-feira, 10 de março de 2011

Petição Pública: MOVIMENTO DE APOIO À CRIAÇÃO DA DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DO PARANÁ

Desde a promulgação da Constituição de 1988, têm sido inglórias as lutas para a estruturação da Defensoria Pública no Paraná e esta desídia com a defesa dos carentes tem suas consequências, uma delas se verifica no dado estatístico de que nosso Estado possui o maior número de presos provisórios da Federação. Os números são verdadeiramente alarmantes, porque mais de 50% dos internos do sistema carcerário em nosso Estado não possuem condenação definitiva e mais de 70% não têm condições de pagar os honorários para receber a orientação e o atendimento de um advogado.
É de conhecimento de todos que as condições das prisões brasileiras são desumanas e este quadro se agrava quando os acusados e condenados acabam encarcerados ainda durante a apuração dos fatos ou ficam presos por tempo indevido, em razão da falta de assistência jurídica de qualidade ou, mais especificamente, de defesa técnica insuficiente.
Além disso, não é difícil constatar que no Paraná não há também o atendimento efetivo da população carente nas esferas judicial e extrajudicial para resolução de questões relativas aos seus direitos individuais e coletivos. Os poucos serviços da assistência jurídica gratuita existentes nas Universidades e em algumas entidades de nosso Estado não conseguem atender a imensa demanda destes cidadãos que tiveram seus direitos violados e isso se confirma numa rápida consulta às listas de espera para atendimento nos núcleos de prática jurídica.
Esta situação de injustiça e de superlotação nas prisões e delegacias paranaenses não pode mais se perpetuar, viola o pacto social na medida em que abala a confiança que a sociedade deposita no Estado para a resolução de conflitos e garantia de seus direitos. Sabe-se que esta insegurança gerada pela negligência estatal pode produzir graves efeitos, dentre eles o retorno às soluções privadas para essas questões, o que certamente levaria aos abusos e arbítrios.
Por tudo isso, é preciso evitar esta típica política neoliberal de diminuição do Estado no que se refere à defesa dos direitos do cidadão, pois só promove ainda mais exclusão e insegurança. Não por outro motivo, faz-se necessário lutar pela criação de órgãos como a Defensoria Pública, capazes de diminuir as desigualdades que marcam o modo de produção capitalista e promover uma estabilidade social possível.
Então, dando visibilidade a Moção do Conselho Universitário da Universidade Federal do Paraná, o NPP-PPGD-UFPR convida toda a comunidade paranaense a apoiar a criação da Defensoria Pública do Estado do Paraná.
Aguarda-se há vinte e dois anos a criação da Defensoria no Estado do Paraná e não se pode esperar mais.

(texto de Clara Roman Borges - Publicado no Caderno "Direito e Justiça" do jornal "O Estado do Parana", no dia 21 de novembro de 2010).

quarta-feira, 9 de março de 2011

Professor(a): não seja outro tijolo na parede... Abaixo ao dogmatismo!



Um dos grandes problemas do sistema de justiça criminal decorre do aparelho ideológico escolar. Na maioria das faculdades de Direito do país ainda vigora o dogmatismo, moendo qualquer perspectiva crítica em relação à superestrutura social, mormente no que tange ao Estado e ao Direito. A cultura manualesca prepondera e os estudantes acabam se (de)formando, (re)produzindo a lógica de dominação de classes no exercício do controle social e da contenção dos impulsos violentos da miséria. A existência de novos atores jurídicos, comprometidos com a Constituição da República, demanda uma teoria jurídica crítica. Portanto: abaixo ao dogmatismo!!!

domingo, 6 de março de 2011

Recado aos jovens...

"Ser jovem e não ser revolucionário é uma contradição genética".
(Che Guevara)

terça-feira, 1 de março de 2011

A Vergonha Catarinense

* Leandro Gornicki Nunes


Santa Catarina não cumpre a Constituição da República. Não temos Defensoria Pública. Temos apenas um arremedo instituído pela Lei Complementar n. 155/97, que estabelece o exercício dessa função à Defensoria Dativa e à Assistência Judiciária Gratuita, organizadas pela OAB/SC. Em síntese, advogados abnegados são designados para defender os interesses dos necessitados em juízo, recebendo, após muito tempo, uma remuneração indigna. Mas, o maior problema não é a péssima remuneração dos defensores dativos e assistentes judiciários. Afinal, os advogados gozam de uma condição social muito melhor que a dos necessitados.

O fato mais perturbador é a subcidadania e o desamparo a que estão submetidos os necessitados. Cotidianamente, vemos pessoas carentes percorrendo escritórios de advocacia para conseguirem um defensor dativo capaz de cuidar da execução penal de presos do sistema carcerário catarinense. Lamentavelmente, os estabelecimentos prisionais de Santa Catarina estão superlotados e a dificuldade de se conseguir um profissional para cuidar dos interesses das pessoas mais carentes é evidente. Os parentes de presos percorrem um longo caminho até conseguirem um defensor dativo, cujo preparo técnico nem sempre é adequado.

Essa situação ficará menos vergonhosa no dia em que a Defensoria Pública vier a ser instituída em uma carreira cujos cargos deverão ser ocupados por candidatos aprovados em concurso público. Sabemos que a estrutura a ser criada não conseguirá responder a toda demanda social, de modo que o atual sistema deverá permanecer paralelamente. Mas, somente assim, o caos social será amenizado. Alguns agentes políticos são contrários a essa ideia. Só que os interesses institucionais e corporativos não podem se sobrepor à Constituição e, principalmente, ao sofrimento dos necessitados.

Este texto será lido por muitos advogados, gerando reflexões e críticas. Porém, esperamos que todos honrem o juramento que fizeram ao receber a sua credencial profissional e bradem, em respeito à Constituição da República: Defensoria Pública já!

Criminologia Radical e Arte: o pensamento lúcido dos Racionais MC's

O homem na estrada recomeça sua vida.

Sua finalidade: a sua liberdade.
Que foi perdida, subtraída;
e quer provar a si mesmo que realmente mudou,
que se recuperou e quer viver em paz, não olhar
para trás, dizer ao crime: nunca mais!
Pois sua infância não foi um mar de rosas, não.
Na Febem, lembranças dolorosas, então.
Sim, ganhar dinheiro, ficar rico, enfim.
Muitos morreram sim, sonhando alto assim,
me digam quem é feliz,
quem não se desespera, vendo
nascer seu filho no berço da miséria.
Um lugar onde só tinham como atração,
o bar e o candomblé pra se tomar a benção.
Esse é o palco da história que por mim será contada.
...um homem na estrada.

Equilibrado num barranco um cômodo mal acabado e sujo,
porém, seu único lar, seu bem e seu refúgio.
Um cheiro horrível de esgoto no quintal,
por cima ou por baixo, se chover será fatal.
Um pedaço do inferno, aqui é onde eu estou.
Até o IBGE passou aqui e nunca mais voltou.
Numerou os barracos, fez uma pá de perguntas.
Logo depois esqueceram, filha da puta!
Acharam uma mina morta e estuprada,
deviam estar com muita raiva.
"Mano, quanta paulada!".
Estava irreconhecível, o rosto desfigurado.
Deu meia noite e o corpo ainda estava lá,
coberto com lençol, ressecado pelo sol, jogado.
O IML estava só dez horas atrasado.
Sim, ganhar dinheiro, ficar rico, enfim,
quero que meu filho nem se lembre daqui,
tenha uma vida segura.
Não quero que ele cresça com um "oitão" na cintura
e uma "PT" na cabeça.
E o resto da madrugada sem dormir, ele pensa
o que fazer para sair dessa situação.
Desempregado então.
Com má reputação.
Viveu na detenção.
Ninguém confia não.
...e a vida desse homem para sempre foi danificada.
Um homem na estrada...

Um homem na estrada..

Amanhece mais um dia e tudo é exatamente igual.
Calor insuportável, 28 graus.
Faltou água, já é rotina, monotonia, não tem prazo pra voltar, hã!
já fazem cinco dias.
São dez horas, a rua está agitada,
uma ambulância foi chamada com extrema urgência.
Loucura, violência exagerado.
Estourou a própria mãe, estava embriagado.
Mas bem antes da ressaca ele foi julgado.
Arrastado pela rua o pobre do elemento,
o inevitável linchamento, imaginem só!
Ele ficou bem feio, não tiveram dó.
Os ricos fazem campanha contra as drogas
e falam sobre o poder destrutivo dela.
Por outro lado promovem e ganham muito dinheiro
com o álcool que é vendido na favela.

Empapuçado ele sai, vai dar um rolê.
Não acredita no que vê, não daquela maneira,
crianças, gatos, cachorros disputam palmo a palmo seu café da manhã na lateral da feira,
Molecada sem futuro, eu já consigo ver, só vão na escola pra comer,
Apenas nada mais, como é que vão aprender sem incentivo de alguém, sem orgulho e sem respeito,
sem saúde e sem paz.

Um mano meu tava ganhando um dinheiro,
tinha comprado um carro,
até rolex tinha!

Foi fuzilado a queima roupa no colégio, abastecendo a playboyzada de farinha,
Ficou famoso, virou notícia, rendeu dinheiro aos jornais, ham!, cartaz à policia
Vinte anos de idade, alcançou os primeiros lugares... super-star do notícias populares!
Uma semana depois chegou o crack, gente rica por trás, diretoria.
Aqui, periferia, miséria de sobra.
Um salário por dia garante a mão-de-obra.
A clientela tem grana e compra bem, tudo em casa, costa quente de sócio.
A playboyzada muito louca até os ossos!
Vender droga por aqui, grande negócio.
Sim, ganhar dinheiro ficar rico enfim,
Quero um futuro melhor, não quero morrer assim,
num necrotério qualquer, um indigente, sem nome e sem nada,
o homem na estrada.

Assaltos na redondeza levantaram suspeitas,
logo acusaram favela para variar,
E o boato que corre é que esse homem está, com o seu nome lá na lista dos suspeitos,
pregada na parede do bar.

A noite chega e o clima estranho no ar,
e ele sem desconfiar de nada, vai dormir tranqüilamente,
mas na calada caguentaram seus antecedentes,
como se fosse uma doença incurável, no seu braço a tatuagem, DVC, uma passagem, 157 na lei...
No seu lado não tem mais ninguém.

A Justiça Criminal é implacável.
Tiram sua liberdade, família e moral.
Mesmo longe do sistema carcerário, te chamarão para sempre de ex presidiário.
Não confio na polícia, raça do caralho.
Se eles me acham baleado na calçada, chutam minha cara e cospem em mim é..
eu sangraria até a morte...
Já era, um abraço!.
Por isso a minha segurança eu mesmo faço.

É madrugada, parece estar tudo normal.
Mas esse homem desperta, pressentindo o mal, muito cachorro latindo.
Ele acorda ouvindo barulho de carro e passos no quintal.
A vizinhança está calada e insegura, premeditando o final que já conhecem bem.
Na madrugada da favela não existem leis, talvez a lei do silêncio, a lei do cão talvez.
Vão invadir o seu barraco, é a polícia!
Vieram pra arregaçar, cheios de ódio e malícia, filhos da puta, comedores de carniça!
Já deram minha sentença e eu nem tava na "treta", não são poucos e já vieram muito loucos.
Matar na crocodilagem, não vão perder viagem, quinze caras lá fora, diversos calibres, e eu apenas
com uma "treze tiros" automática.
Sou eu mesmo e eu, meu deus e o meu orixá.
No primeiro barulho, eu vou atirar.
Se eles me pegam, meu filho fica sem ninguém, e o que eles querem: mais um "pretinho" na febem.
Sim, ganhar dinheiro ficar rico enfim, a gente sonha a vida inteira e só acorda no fim, minha verdade
foi outra, não dá mais tempo pra nada... bang! bang! bang!

Homem mulato aparentando entre vinte e cinco e trinta anos é encontrado morto na estrada do
M'Boi Mirim sem número.
Tudo indica ter sido acerto de contas entre quadrilhas rivais.
Segundo a polícia, a vitíma tinha vasta ficha criminal."

Nova súmula do STJ trata de regime prisional em crimes hediondos

Súmula n. 471: "Os condenados por crimes hediondos ou assemelhados cometidos antes da vigência da Lei n. 11.464/2007 sujeitam-se ao disposto no artigo 112 da Lei n. 7.210/1984 (Lei de Execução Penal) para a progressão de regime prisional”.

segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

É possível pena alternativa e regime inicial aberto para casos de tráfico

É possível a substituição da pena privativa de liberdade por medidas restritivas de direitos, bem como o estabelecimento de regime diverso do fechado, em condenações por tráfico de drogas. A decisão é da Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que reafirmou tanto a sua jurisprudência quanto a do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre o tema.
A apenada foi presa em flagrante ao tentar levar, na vagina, 58 gramas de cocaína a detento na Penitenciária de São Sebastião (DF). A pena foi fixada em um ano e onze meses de reclusão, mais multa, a ser cumprida em regime inicial fechado. Para o Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT), a Lei n. 11.343/2006 (Lei de Tóxicos) impediria o benefício. A mesma norma também inviabilizaria a substituição da pena por medida restritiva de direitos.
Mas, segundo o ministro Og Fernandes, a referida legislação não é harmônica com os princípios da proporcionalidade. “A imposição do regime fechado, inclusive a condenados a penas ínfimas, primários e de bons antecedentes, entra em rota de colisão com a Constituição e com a evolução do Direito Penal”, asseverou.
Nas instâncias ordinárias, a pena da condenada foi fixada no mínimo legal, de cinco anos de reclusão, e a minorante do artigo 33, parágrafo 4º, da Lei 11.343/06 – aplicada a agente primário, portador de bons antecedentes, que não integre organização criminosa nem se dedique a tais fins – foi estabelecida no patamar máximo. Por isso, apesar da disposição da lei, o regime inicial aberto seria perfeitamente aplicável, diante do princípio da individualização da pena.
Ressaltou-se, ainda, que a pena pode ser substituída por prestação de serviços e limitação de fim de semana. Tal entendimento já é aplicado pela Sexta Turma há pelo menos um ano e está alinhado com o ponto de vista do STF sobre o tema.
O ministro citou decisão do Supremo (HC 97.256/RS), relatada pelo ministro Carlos Ayres Britto, na qual o tribunal declara, de forma incidental, a inconstitucionalidade dos dispositivos da Lei de Tóxicos que vedam a conversão da pena em medida alternativa.
“Considerando a pena aplicada – 1 ano, 11 meses e 9 dias de reclusão em regime aberto –, bem como a primariedade e inexistência de circunstâncias judiciais desfavoráveis à substituição [de pena], é medida que se impõe”, concluiu o relator.
(STJ, HC n. 191.046/DF, 6ª Turma, rel. Min. Og Fernandes, v.u., j. 03/02/2011)