Marcos Eduardo Fuchs Pedro*
O objetivo do presente texto é analisar a natureza da ação penal no crime de lesão corporal leve cometido contra a mulher no âmbito familiar ou doméstico, conforme a redação do art. 129, §9º, do Código Penal. Pela natureza do crime (lesão leve), a ação penal depende da representação do ofendido, ou, especificamente, da ofendida, conforme disposição do art. 88, da Lei n. 9.099/95, in verbis: “Além das hipóteses do Código Penal e da Legislação especial, dependerá de representação a ação penal relativa aos crimes de lesões corporais leves e culposas”.
Neste ponto inicia-se uma controvérsia em relação à Lei Maria da Penha (Lei n. 11.340/06), pois o legislador, quando da elaboração desta lei, postulou em seu art. 41 uma proibição à incidência dos institutos da Lei n. 9.099/95, fazendo alguns intérpretes concluírem que não seria permitindo que o crime em tela fique sujeito à discricionariedade da mulher ofendida.
Apesar da expressa proibição do art. 41, da Lei n. 11.340/06, o Superior Tribunal de Justiça vem entendendo que esse dispositivo legal só alcança a transação penal e a suspensão condicional do processo, não impedindo a aplicação do art. 88, da Lei n. 9.099/95. Cumpre destacar que a própria Lei Maria da Penha se contradiz. Isso se verifica quando da leitura de dois de seus dispositivos: o art 12, inciso I e o art. 16. Segundo esses dispositivos legais, é plenamente possível a manutenção da representação da ofendida como condição para o início da persecução criminal. O art. 16, dispõe: “Nas ações penais públicas condicionadas à representação da ofendida de que trata esta lei, só será admitida a renúncia à representação perante o juiz, em audiência especialmente designada para tal finalidade, antes do recebimento da denúncia e ouvido o Ministério Público”. Portanto, se a vítima só pode retratar-se da representação perante o juiz, é porque a ação penal é condicionada à representação, não se renuncia algo que não foi anteriormente proposto. Ademais, o art 12, inciso I, da Lei n. 11.340/06, preceitua: “Em todos os casos de violência doméstica e familiar contra a mulher, feito o registro da ocorrência, deverá a autoridade policial adotar, de imediato, os seguintes procedimentos, sem prejuízo daqueles previstos no CPP...Inciso I: ouvir a ofendida, lavrar o boletim de ocorrência e tomar a representação a termo, se apresentada”. Dessa forma, nota-se que é sim de ação penal pública condicionada à representação os casos de lesão leve contra mulher, ainda que praticada no âmbito das relações domésticas. Ainda, não se olvide que não há dispositivo específico dizendo o contrário.
malgrado tais constatações legais, jurisprudência e doutrina ainda levantam a tese de que o art. 16, da Lei Maria da Penha, exige a representação somente para outros crimes cometidos contra a mulher, como por exemplo ameaça e injúria. Mas, a esta tese falta, ao meu ver, coerência sistemática, pois as disposições legais não distinguem os crimes que devem ou não ser submetidos à representação e, portanto, não cabe ao Juiz fazer essa distinção in malam partem.
malgrado tais constatações legais, jurisprudência e doutrina ainda levantam a tese de que o art. 16, da Lei Maria da Penha, exige a representação somente para outros crimes cometidos contra a mulher, como por exemplo ameaça e injúria. Mas, a esta tese falta, ao meu ver, coerência sistemática, pois as disposições legais não distinguem os crimes que devem ou não ser submetidos à representação e, portanto, não cabe ao Juiz fazer essa distinção in malam partem.
Diante da dicotomia apresentada, a ação penal in casu deve ser pública condicionada à representação da ofendida, pois, concluir o contrário é sintoma de uma inconstitucionalidade, porque fere o princípio da legalidade, além de constituir uma punição sem finalidade, uma vez que a ausência de representação evidencia a pacificação de um conflito conjugal ou familiar. Dito de outra forma: se a própria vítima não possui mais o interesse em ver processado e julgado o seu agressor - e isso pode ocorrer por inúmeros motivos, pois é de âmbito individual e deve(ria) ser respeitado -, nenhuma razão assiste ao Estado em punir, punir e punir. Afinal, há outros meios de se resolver essa e tantas outras questões. O uso da coerção, tão desejado por muitos, deve ser visto de modo subsidiário, como um último plano (ultima ratio).
E, por fim, se a mulher (sujeito de direito emancipado) achar que a situação chegou a um extremo, basta não renunciar à representação.
E, por fim, se a mulher (sujeito de direito emancipado) achar que a situação chegou a um extremo, basta não renunciar à representação.
* Acadêmico de Direito da Univille (Universidade da Região de Joinville)
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