O filme La Zona (1), premiado no Festival de Cinema de Toronto em 2007, é uma grande contribuição para a criminologia crítica e um retrato do modo como muitas pessoas estão vivendo e pensando as questões criminais nos grandes centros urbanos, onde proliferam condomínios residenciais fechados, semelhantes aos castelos medievais que separavam a nobreza dos servos. Em resumo, na Cidade do México, Alejandro (Daniel Tovar) é um adolescente que vive em La Zona, um condomínio fechado protegido por guardas particulares. No dia de seu aniversário três jovens de uma favela vizinha invadem o local, para assaltar uma das casas. Durante o assalto eles matam uma mulher, mas a empregada da casa consegue fugir e avisa a segurança local, que acaba matando dois dos invasores. Porém, Miguel (Alan Chávez), um jovem de 16 anos, consegue se esconder, sem conseguir fugir de La Zona, em face do aparato tecnológico que monitora o lugar. Logo em seguida um grupo de moradores se reúne em assembléia, onde fica decidido que nada será dito às autoridades públicas e que eles próprios procurarão Miguel, que está escondido no interior do condomínio.
A correlação do filme com a realidade atual dos grandes centros urbanos está fundada na flagrante divisão social, onde as pessoas privilegiadas economicamente têm uma obsessão por segurança e querem impor a sua própria lei: “olho por olho, dente por dente”. A lógica de Talião é o que move as ações das pessoas na “caça ao bandido” ainda não localizado.
No meio dessa trama, o medo aparece a cada cena do filme como o grande tormento dos personagens, que representam fidedignamente as pessoas da classe média e alta de sociedades como a brasileira. Nesse ambiente, não há confiança em ninguém. Os pais desconfiam dos filhos e os filhos desconfiam dos pais. Ninguém confia em ninguém! A intransigência é uma característica das decisões. Afinal, o conteúdo das decisões (extremado) é proporcional ao medo sentido por todos, principalmente, a partir do isolamento nessa ilha do privilégio, onde o outro (estrangeiro) é um desconhecido, e, dessa forma, passa a ser aterrorizante.
A corrupção é outra conseqüência desse mundo de desigualdades sociais, onde – não raro – os detentores do poder econômico se sentem legitimados a “comprar” qualquer funcionário público vinculado ao sistema de justiça criminal, o que acaba sendo um catalisador das desigualdades do processo de criminalização secundária. Nota-se que a seletividade do sistema de justiça criminal tem como principal causa as desigualdades sociais, pois, esse sistema é extremamente eficaz no controle e destruição daqueles que não pertencem aos extratos mais ricos dessa sociedade.
Os excluídos de La Zona, não possuem qualquer utilidade e, magistralmente, o diretor Rodrigo Plá esbofeteia a face do espectador do filme, no momento em que os rapazes invasores (mortos) são colocados em sacos de lixo e descartados na caixa coletora do condomínio, sem direito a qualquer garantia processual ou última homenagem de seus familiares. Lixo! Isso é o que eles são para os moradores do condomínio.
Esse simulacro de um estado de polícia evidencia o pensamento totalitário dos moradores de La Zona. Nessas condições, o outro não é reconhecido como sujeito. Porém, felizmente, Alejandro, representa a esperança que devemos ter num futuro com menos intolerância e reconhecimento à exterioridade, onde o outro espera ser reconhecido como sujeito, eis que só assim alcançaremos uma democracia radical.
(1) PLÁ, Rodrigo. La Zona. [Filme-vídeo]. Direção de Rodrigo Plá. México. 2007. DVD, 93 min. color. son.
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